divórcio ou casamento eterno?...

2006-02-14

Primado da Pessoa

Quando fui para o hospital, havia duas notícias a que se juntou uma terceira, que se me associaram no meu espírito.
Primeira notícia: a ameaça de Chirac, de inclusivamente usar a bomba atómica para, já não me lembro bem, acabar com a ameaça do Irão.
Primeira questão: Donde vem a superioridade moral dos países do Ocidente para terem bombas atómicas e proibí-las aos outros? Por que não autorizam os EUA a fiscalização das suas fábricas de armas químicas e impõem a fiscalização aos outros?
Segunda notícia: os países ocidentais ameaçaram com retaliações depois de o Hamas ter vencido democraticamente as eleições.
Segunda questão: Donde vem a superioridade moral dos Ocidentais para dizerem aos povos quem devem ou não escolher? Que democracia é a nossa que só aceita os resultados que servem os nossos interesses?
Terceira notícia: os cartoons a associar Maomé ao terrorismo.
Num momento em que se está a tornar tão difícil estabelecer um diálogo Ocidente - Árabes, não seria uma questão de elementar bom senso evitar tudo o que possa envenenar esse diálogo, mesmo que isso significasse prescindir momentaneamente de um direito? O cartoonista pode fazer os cartoons que lhe agardem, mas ele não vive isolado e os caminhos da paz estão profundamente armadilhados. Será que não temos o direito de exigir de todos um contributo sério para a paz no mundo?
Naturalmente que condeno absolutamente as violências que estes desenhos desencadearam, até a violência só acarreta violência e os fundamentalistas deliram com estes argumentos idiotas de uns artistas, que absolutizam a liberdade de expressão, como se não houvesse nenhuns outros problemas neste mundo onde todos os dias milhares de pessoas morrem de fome.

Parece-me que a Europa, cuja característica fundamental é a bertura e a tolerância, pode estar a cometer alguns erros de análise.
O Ocidente considera-se a civilização por execelência, a detentora de valores e critérios a que todos os outros se devem submeter para que o mundo viva em paz. Este etnocentrismo é, como todos os etnocentrismos, perigoso para a paz e para o diálogo. É a aplicação do que Boaventura Sousa Santos, se não me engano, chama a "hermenêutica diatópica": analisamos a realidade dos outros não a partir dos seus TOPOI (valores) mas dos nossos e esta avaliação torna-se não só ilegítima como extremamente redutora.
O Ocidente preocupa-se especialmente com os direitos da 1ª geração (cívicos e políticos)baseados na liberdade como valor supremo. Mas ignora, mesmo nos modelos mais sociais, os direitos de 2ª geração (baseados na igualdade) ou de 3ª geração (baseados na solidariedade). Será, por exemplo, admissível que PAC dê cerca de mil milhões de euros por dia aos "pobres" agricultores do Norte bloqueando assim qualquer possibilidade de desenvolvimento da agricultura do Terceiro Mundo.
No Ocidente temos muito a tendência a igualar todos os árabes e muçulmanos, esquecendo as inúmeras escolas teológicas, mas sobretudo a esmagadora maioria dos imãs que proclamam a paz. É muito mais interessante para a venda de jornais e geurras de audiência falar de dois ou três criminosos fundamentalidsas do que dar o testemunho dos milhares de "fazedores da paz".
O Ocidente parece muito preocupado com valores (liberdade disto e daquilo), às vezes tão pobes (Walesa falava- com que fundamento? - da falta de valores do Ocidente) e outras vezes tão formais (vale mais a letra que o espírito) mas muito pouco com a pessoa. E só a pessoa (enquanto ser pessoal e social, comunitário, tribal, nacional, continental) é que é o critério absoluto para qualquer política ou tomada de decisões.
Onde está a pessoa do outro?

A superioridade civilizacional não está na capacidade de sermos iconoclastas e absolutamente livres de fazer o que nos apetecer (atitude tão típica de algum Ociente) nem na capacidade de resposta pronta e fundamentalista a supostas ofensas alheias (atitude tão típica de algum Oriente), mas na capacidade de nos respeitarmos e cuidarmos do outro, que é um irmão nosso desta humanidade que deve tender a tornar-se uma única família.

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