divórcio ou casamento eterno?...

2006-07-31

CV(11) O Cireneu

Hoje vou falar-lhes do meu grande colega nesta caminhada.
É um cabide mais alto que eu com 5 sapatas, isto é, rodinhas, que às vezes funcionam como as rodas dos carros do supermercado: querem levar-me para maus caminhos.
A meio tem uma caixa, que não é negra, mas é muito inteligente.
Andou sempre comigo: na cama, no refeitório, na casa de banho, quando tomo banho. Não me larga um bocadinho. Num dos ganchos do cabide costuma andar uma garrafa ou de medicamento ou de soro que vai passando para o meu corpo via catéter. Outro gancho serve, por exemplo, para trazer o meu chapéu, quando não o trago na cabeça, porque nunca se sabe o tempo que vai fazer.
Além de fiel é muito inteligente. Através de um teclado marca-se na dita caixa, que não é negra, a velocidade de escoamento do líquido e depois a caixa controla tudo.
Está um gota de ar no tubo, começa a apitar; o tubo está dobrado, começa a apitar; a bateria que lhe dá autonomia para duas horas fica fraca, começa a apitar; passa por cima de um soalho rugoso, edesequilibra-se, começa a pitar. E apita, apita, apita, de modo insistentemente irritante, até que se carregue na tecla adequada depois de resolvido o problema em questão. Se não ficar resolvido, ela volta a apitar, apitar... O apito, insistente, ouve-se por todo o pavilhão.
Mas o que me deixa mais sossegado é saber que ela apita quando o líquido acaba; não só apita como fecha o circuito evitando o refluxo.
Realmente na primeira vez que andei a levar estas doses, o meu cabide não tinha a tal caixinha mágica. Resultado: quando havia algum problema, sobretudo de escoamento, não havia apitos a avisar. E durante a noite, lá estava eu de olho alerta, entre dois bochecos de sono, não fosse o dito líquido acabar ou deixar de correr.
E nem as palavras calmantes da enfermeira "Durma descansado que nós vamos passando e temos tudo sob controlo" me sossegavam. Não era que eu desconfiasse da enfermeira, longe disso, mas sabe-se lá o que pode acontecer. Se o diabo nem sempre está atrás da porta, às vezes está mesmo.
Esta maquineta cúbica com um palmo de lado é sobretudo a imgem de uma medicina que evoluiu exponencialmente não só nos tratmentos mas também no modo de os administrar.
Ao recordá-la aqui quero prestar homenagem a todos aqueles que se dedicam a estes pequenos pormenores que são tão libertadores para quem já está em sofrimento.