divórcio ou casamento eterno?...

2006-03-08

8 de Março

O simples facto de haver um "Dia da Mulher" e não haver um "Dia do Homem" é já um indicador claríssimo da mentalidade dominante nas nossas sociedades (tão democráticas!), da qual as mulheres não estão isentas de responsabilidade.
Mas para dar o meu contributo para este debate começo por citar a parte final do artigo do Joaquim Fidalgo no Público, onde mostra outra imagem claríssima desta mentalidade (mas agora com o apoio das próprias mulheres), referindo-se ao modelo televisivo dos comentários políticos na televisão, todos seguindo um mesmo modelo: "ao lado, uma mulher bonita, com bom ar e bom nome, emprestando ao quadro uma certa aura de credibilidade jornalística e criando uma ilusão de diálogo; no centro da acção, um homem a debitar verdades definitivas, qual oráculo ritual dos tempos modernos. Sem desprimor, parecem quase aquelas cenas do ilusionista mais a sua partenaire, aquela que lhe chega as coisas. A mulher faz, ou faz de conta que faz, as perguntas; o homem, obviamente, dá as respostas. Assim é que é...".
Esta menoridade da mulher é também evidente, ou ainda mais, na Igreja.
E, no entanto, é na Bíblia que certamente encontramos as passagens mais libertadoras da mulher. O comportamento de Jesus, que deveria servir de modelo a todos os seus discípulos, nos quais se incluem o Papa, os bispos, os padres e naturalmente os leigos. Mas, logo na primeira página, se afirma: "Criou Deus o ser humano à sua imagem; à imagem de Deus o criou, macho e fêmea os criou" (Gn 1,27).
Mas logo uma exegese rabínica, patriarcal e antifeminista, que veio influenciar significativamente os pensadores e exegetas cristãos, inutilizou esta afirmação primeira e fundante, subordinando-a a pormenores secundários: a mulher deve estar subordinada ao homem porque foi criada em segundo lugar (Gn 2,22); a mulher é uma perigosa sedutora, pois até consegue seduzir os filhos dos deuses (Gn 6,29; a mulher é responsável pela introdução do pecado no mundo (Gn 3,6).
O contexto cultural mesopotâmico, de acordo com a tese de A.S. Vaz (A visão das origens em Génesis 2,4b-3,24. Coerência temática e unidade literária), indicaria exactamente o contrário. "Abrir os olhos" significa, no contexto sumério, a passagem da condição de incivilizado a civilizado. Sendo este gesto "civilizador" feito pela mulher, o papel da mulher dever ser reavaliado: "Em Gn 3,1-6 é a mulher que descobre as propriedades da 'árvore para adquirir o conhecimento' (3,6); e numa acção em favor da humanidade (da qual vai ser apresentada mãe: 3,20), consegue, por meio do motivo da 'comida' duma árvore violadora duma proibição divina, arrebatar o precioso 'conhecimento', fonte da cultura humana, embora, simultânea e ambiguamente, fonte das conotações negativas da vida e ocasião da morte. (...) Desta interpretação resulta claramente que as caracterizações exegéticas e espirituais negativas, que pintam a mulher como outra serpente, desencaminhadora e tentadora do homem para o pecado, causa essencial das desgraças humans, não ficam legitimadas pela compreensão mítica do texto e são infiéis ao seu ímpeto significante. Devem-se a uma exagese masculina, feita mais a partir de pressupostos culturais e sociais dos intérpretes do que a partir do fundo cultural do texto. Já se encontram nos Padres e percorrerão ininterruptamente a mentalidade cristã mediante grandes nomes de santos e doutores da Igreja, contribuindo para a visão negativa da mulher que invadiu a história humana até ao presente" (pp. 244-245).
E já agora, que significado deve atribuir-se às recentes palavras de Bento XVI, que, depois de recordar a incapacidade da Igreja para autorizar a ordenação das mulheres (!?), conclui: "Todavia é justo perguntar-se se, no serviço ministerial, apesar do facto de o Sacramento e o carisma serem o único binário em que se realiza a Igreja, não se poderá oferecer mais espaço, mais posições de responsabilidade às mulheres"?

4 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

Zé Dias, que reflexão tão acertada e que bem fundamentada!
Faço minhas estas tuas reflexões.
LC

9/3/06 17:24

 
Anonymous Anónimo disse...

Hoje já são 15. Esperava que houvesse algo escrito de propósito. Como não há, aqui fica um grande abraço neste teu dia de aniversário.
ASimões

15/3/06 19:58

 
Blogger Zé Dias disse...

Isto de fazer anos é já um hábito tão arreigado que nem sei se merece comentários.
De qualquer modo o deste ano talvez merecesse umas palavrinhas, mas...

16/3/06 17:18

 
Blogger xana disse...

Deixo um abraço.

18/3/06 00:39

 

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