divórcio ou casamento eterno?...

2008-06-22

Trabalhar 13 horas por dia

O Conselho de Ministros do Emprego da União Europeia tentou desdramatizar, dizendo que mantém o limite máximo de 48 horas semanais e não impede os estados-membros de estabelecer um limite inferior de tempo de trabalho, acrescentando que a única novidade é que um "regime de excepção" segundo o qual "os trabalhadores podem optar por exceder as 48 horas de trabalho por semana, se o Estado-membro o permitir, através de legislação específica ou através de um acordo com os parceiros sociais", que devem cumprir um conjunto de condições de defesa do trabalhador.
Apesar desta tentativa de desmentido da aprovação de 65 horas semanais, tal decisão é uma machada gravíssima nos direitos dos trabalhadores e também no modelo social europeu. Esta decisão acaba com a conquista das 48 horas, obtida em 1917, depois de longos anos de lutas sindicais dolorosas desde a greve de 1886, em Chicago.
Dizer que assim se criam "melhores condições para os trabalhadores", porque permite a cada trabalhador negociar individualmente o seu tempo laboral é esquecer que o trabalhador é sempre a parte mais fraca. Por alguma razão se criou um direito do trabalho. Se não houvesse condições específicas certamente bastaria o direito civil “comum”. Sendo a parte mais fraca, o trabalhador vai estar muitas vezes pressionado para aceitar condições inaceitáveis. Já Leão XIII condenava tal facto: “Portanto, mesmo que o patrão e o operário convenham livremente nalguma coisa, e particularmente no salário, fica sempre em pé um princípio que dimana da justiça natural, mais importante e anterior que a livre vontade dos interessados, que estabelece que o salário nunca deve ser insuficiente para assegurar a subsistência do operário sóbrio e de bons costumes. E se viesse a suceder que o operário obrigado pela necessidade ou por receio de um mal maior, aceitasse condições inferiores, que não pudesse recusar por lhe terem sido impostas pelo patrão, então estaríamos em face de uma violência contra a qual se insurge a justiça” (RN 32).
Trabalhar 65 semanas por semana dá a insignificância de 13 horas por dia, a menos que se queira também acabar com o fim de semana.
E já agora uma perguntinha que sempre me inquieta: como é que é possível que tendo aumentado a produtividade com aumentou é necessário que o trabalhador trabalhe cada vez mais? Um simples cálculo permite-nos verificar que desde a revolução industrial a produtividade aumentou mais de 25 vezes: o tempo de trabalho passou de 3600 horas anuais, em 1840, para 1650 actualmente, isto é, sofreu uma redução superior a 50%; por outro lado, a produção por activo multiplicou-se por 13. Assim sendo, a produtividade aumentou mais de 26 vezes. Quem ganha com este aumento? Não deveríamos numa sociedade humana trabalhar cada vez menos para termos tempo cuidar do outro, admirar a natureza, cultivar os amigos, realizar projectos para os quais nunca há tempo, “não fazer nada”? Além disso, não estamos nós com tanto desemprego estrutural? Então por que obrigar a trabalhar tanto como há dois séculos atrás?
Não é esta Europa que eu desejo que se cumpra. Quero uma Europa que defenda o seu modelo social europeu e não se deixe colonizar pelos modelos asiático ou americano. A Europa não pode embarcar em violações inaceitáveis da dignidade da pessoa.
Curiosamente os que tanto falaram do referendo ao Tratado de Lisboa, parece que não têm nada a dizer a estes desmandos bem mais graves.

0 Comentários:

Enviar um comentário

<< Home