divórcio ou casamento eterno?...

2008-06-10

Heróis de Portugal

Foi uma alegria / ganhar 2-0 à Turquia. / Até dá para fazer poesia!
Mas não é de futebolistas que quero falar. Apenas recordar que, enquanto todos lhes batem palmas (e que não lhes doam as mãos até 30 de Junho!!!), há outros portugueses famosos não tanto conhecidos, mais a mais, nesta euforia futebolística.
Entre muitos, escolho João Magueijo, que apenas com 40 e poucos anos recebeu rasgados elogios do New York Times pela sua capacidade de divulgação científica numa estação televisiva.
Extremamente irreverente, diria mesmo iconoclasta, ao seu lado Mourinho parece um menino de coro, como cada um pode verificar lendo o seu livro “Mais rápido que a luz” traduzido pela Gradiva. Três exemplos apenas, nos quais ele coloca em causa a actual organização científica.
“Se pensam que os cosmólogos vivem num estado permanente de excitação intelectual, desenganem-se. A verdade é que a nossa sobrevivência financeira está à mercê de instituições extremamente burocráticas que gerem os orçamentos da ciência. Estas instituições são controladas por ex-cientistas já muito fora de prazo. Têm enorme poder, mas à parte isso são uma espécie de ferros-velhos intelectuais” (p. 156).
“Claro que não há bela sem senão e, na prática, num clima destes, corre-se sempre o risco de que nos roubem as ideias. Estes sítios são frequentados por muitas pessoas que trabalham esforçadamente, mas que não têm qualquer talento ou imaginação e andam por lá a ouvir conversas “informais”, a partir das quais constroem carreiras de sucesso. Todos os anos uma universidade americana de renome atribui um prémio ao melhor artigo baseado na ideia de alguém que não o autor” (p. 180).
“Os chefes do Imperial (College, onde é ou foi professor de Física Teórica) gostam de se ver como chulos científicos, num contexto em que os cientistas fazem o papel de putas” (p. 218).
Mas o livro não é só isto.
É certamente uma “autobiografia” onde se destacam todas as lutas, ciúmes e guerras entre cientistas e responsáveis universitários, mas é também a história da sua ainda inacabada teoria VSL (variable speed of light, teoria da “velocidade da luz variável”). Perante uma série de questões levantadas pelo modelo actual do big bang, ele começa por perguntar: “E, se no Universo primordial, a própria luz se tivesse propagado mais depressa do que o faz hoje? Será que resolveria alguns dos enigmas? E a que preço para a física como a entendemos?” (p. 147). Mas isto ia pôr em causa um dos postulados fundamentais do monstro Einstein: a constância da velocidade da luz. De qualquer maneira não era o primeiro a perguntar-se se num mundo e num tempo tão violento como foram os seus primeiros instantes, as constantes físicas se mantiveram mesmo constantes: por exemplo, Paul Dirac perguntava: "Por que é que as constantes da natureza têm o valor que têm?”.
A partir dessa questão, Magueijo foi analisando as consequências e verificou que podia encontrar algumas respostas e algumas com consequências bem espantosas quanto a viagens espaciais, buracos negros, dilatação do tempo ou teoria das cordas.
E foi concluindo que “a raiz de todos os males era obviamente a relatividade restrita (de Einstein)” (p. 264), ironizando: “Deste ponto de vista, pareceria então que postular a invariância da velocidade da luz mais não é que uma convenção, uma definição da unidade de tempo que, por sua vez, assegura que o postulado é válido. Será o famoso postulado de Einstein tautológico?” (p. 238).
Não absolutiza a sua teoria: “E se estiver errada? Diverte-me que alguns dos meus colegas – justiça seja feita, uma minoria de entre eles – estejam desesperados por ver a VSL ir por água abaixo. São pessoas que nunca tiveram tomates (parece que o original é mais vernáculo) de tentar algo verdadeiramente novo” (pp. 272s).
Citando J. Barrows, concorda que “qualquer ideia nova atravessa três etapas aos olhos da comunidade científica. Etapa 1: é uma grande merda, não queremos sequer ouvir falar nela. Etapa 2: não está errada, mas não tem certamente qualquer relevância. Etapa 3: é a maior descoberta de todos os tempos e nós chegámos lá primeiro. É certo que, se a VSL estiver correcta, não faltarão adversários actuais a reclamar prioridade na sua descoberta. Isso é tão certo como eu já ter embarcado noutra aventura intelectual”(p. 273).
Criativo, imaginativo e sempre disposto a navegar pelos mundos desconhecidos da ciência, sente-se feliz por contribuir para a eterna busca da verdade que a ciência sempre terá de ser, tendo a coragem de afrontar ideias feitas e dogmas que querem eternizar-se.
Até porque os cientistas têm muito de religiosos... quanto estão em causa os seus intocáveis dogmas.

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