divórcio ou casamento eterno?...

2009-01-16

Viva a crise!

Muitos terão lido o artigo de Clara Ferreira Alves no Expresso, no qual passa em revisão todos os sectores da vida pública: rendas (não casas) económicas distribuídas pela Câmara de Lisboa; ensino público; as modernas obras de santa Engrácia, como o processo Camarate, o desaparecimento de Madeleine McCann, o processo Casa Pia, os casos Portucale, Operação Furacão, compra dos submarinos, escutas ao primeiro-ministro, Universidade Independente, Universidade Moderna, Futebol Clube do Porto, Sport Lisboa Benfica, corrupção dos árbitros, corrupção dos autarcas, Braga Parques, o grande empresário Bibi, queixas tardias de Catalina Pestana e de João Cravinho. Isto sem falar dos casos esquecidos: os doentes infectados por acidente e negligência; o miúdo electrocutado no semáforo e o outro afogado num parque aquático, as crianças assassinadas na Madeira, os crimes imputados ao padre Frederico, o autarca alentejano queimado no seu carro e cuja cabeça foi roubada do Instituto de Medicina Legal, a miúda desaparecida em Figueira, o processo do Parque, onde tantos clientes buscavam prostitutos, alguns menores, onde tanta gente "importante" estava envolvida. E pergunta: o que aconteceu?
Ou melhor, o que está a acontecer connosco? Como a autora esclarece, “vivemos no país mais inconclusivo do mundo, em permanente agitação sobre tudo e sem concluir nada”, onde “nada é levado às últimas consequências, nada é definitivo e tudo é improvisado, temporário, desenrascado”.
Mas, pergunto eu, por que acontece isto entre nós? O que se passa connosco? O que se passa com a nossa sociedade hoje? Penso que vivemos numa sociedade egoísta, em que só se luta pelos interesses individuais ou grupais, às vezes bem mesquinhos, porque ninguém quer prescindir do que chama os “seus direitos adquiridos” que não passam de privilégios injustos, porque (só) os outros é que devem pagar a crise, porque no meio de tantas dificuldades não somos capazes de tomar consciência de que a crise que existe passa também por muitos dos nossos hábitos que não queremos perder: cunha, compadrio, mordomia, corrupção; porque alimentamos uma economia paralela para não ter de pagar mais com a factura; no fundo, porque que perdemos todo um conjunto de valores essenciais para construir e reforçar o bem comum, entendido como o bem de todos e de cada um, porque perdemos a noção de que numa sociedade “todos somos verdadeiramente responsável por todos” (SRS 38), porque não queremos saber dos nossos 2 milhões de pobres, porque não queremos partilhar o trabalho num país onde o desemprego vai aumentar, porque achamos que todos os problemas devem ser resolvidos pelos governos, porque não queremos maçar-nos a dar o nosso contributo como cidadãos e como comunidades.
A resposta é bem simples, na sua complexidade, e foi bem resumida pela autora: “Portugal tem um défice de responsabilidade civil, criminal e moral muito maior do que o seu défice financeiro”.
E nisto todos somos culpados: famílias, professores, comunidades religiosas, movimentos cívicos, responsáveis políticos e, talvez mais que todos, a comunicação social. Ninguém está isento de culpas.
O problema é que quando todos são culpados, ninguém é culpado, porque cada um olha para o lado com olhar acusador e nada faz para se mudar nem para mudar alguma coisa à sua volta.
Uma crise é o cenário ideal para mudar de vida. E o que nós precisamos é de mudar de vida. Será que esta crise vai dar uma ajuda? Em vez de discutirmos coisas miudinhas, até nas mais altas instâncias, seremos capazes de nos unir e ir ao cerne dos problemas?
Se não, a crise não só foi uma oportunidade perdida como foi ocasião para nos perdermos ainda mais.

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