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2009-12-28

CinV (75) Mercado e Confiança (nº 35)

O Papa inicia aqui uma reflexão mais aprofundada do mercado.
E começa por ligar mercado e confiança, precisamente numa altura em que se fala tanto da falta de confiança como um dos sustentáculos da crise: “O mercado, se houver confiança recíproca e generalizada, é a instituição económica que permite o encontro entre as pessoas, na sua dimensão de operadores económicos que usam o contrato como regra das suas relações e que trocam bens e serviços entre si fungíveis, para satisfazer as suas carências e desejos”.
Esta afirmação resume várias ideias importantes.

Confiança
Apesar da confiança não ser hoje uma virtude vivida como tal, ela torna-se obrigatória para o funcionamento do mercado. Na base da crise financeira estão uma confiança traída e depois uma desconfiança generalizada. A recuperação só pode ser completa quando a confiança for restaurada. Sem confiança, não há negócios: não porque os intervenientes amem a confiança, mas porque a quebra de confiança descredibiliza quem a comete e isso pode trazer-lhe amargas consequências.

Mercado como espaço privilegiado do encontro entre os operadores económicos
Já João Paulo II afirmara que “tanto a nível das nações como das relações internacionais, o livre mercado parece ser o instrumento mais eficaz” (CA 34), porque favorece a dinamização dos recursos, o intercâmbio e as respostas às necessidades e às preferências das pessoas, assegura a estabilidade da moeda e a firmeza das relações sociais e desenvolve a livre criatividade humana. Contudo muitas são os perigos elimitações, como a redução da pessoa a mero produtor e consumidor de mercadorias, a transformação o trabalho em mercadoria , a multiplicação de fenómenos de marginalização, exploração e miséria.

Bens e Serviços fungíveis
O adjectivo “fungíveis” é fundamental, pois o âmbito do mercado apenas abarca “as necessidades «solvíveis», que gozam da possibilidade de aquisição e os recursos «comercializavéis», isto é, capazes de obter um preço adequado. Mas existem numerosas carências humanas, sem acesso ao mercado” (CA 34). Por isso, não podemos cair na "idolatria do mercado" como se ele fosse a panaceia para todas as nossas necessidades. Esta idolatria é sustentada pela generalização de uma ideologia radical, que “confia fideisticamente a solução (dos problemas) ao livre desenvolvimento das forças de mercado” (CA 42), esquecendo que a orientação para o bem comum tem de ser o grande critério a respeitar.

Satisfação das Necessidades humanas
Este é o principal objectivo do processo económico. A pessoa, para viver, tem necessidade a satisfazer e, nas circunstâncias actuais, já não existe a autonomia da “casa” (oikós), onde cada um podia obter tudo o que precisasse. Por isso, João Paulo II reconhecia neste aspecto uma importante fonte de riqueza: “Aliás, muitos bens não podem ser adequadamente produzidos através de um único indivíduo, mas requerem a colaboração de muitos para o mesmo fim. Organizar um tal esforço produtivo, planear a sua duração no tempo, procurar que corresponda positivamente às necessidades que deve satisfazer, assumindo os riscos necessários: também esta é uma fonte de riqueza na sociedade actual” (CA 32).
Mas aparece logo a marca do pecado a funcionar, que acaba por estimular necessidades, muitas delas criadas artificialmente sem ter em conta o bem da pessoa: “Individuando novas necessidades e novas modalidades para a sua satisfação, é necessário deixar-se guiar por uma imagem integral do homem, que respeite todas as dimensões do seu ser e subordine as necessidades materiais e instintivas às interiores e espirituais. Caso contrário, explorando directamente os seus instintos e prescindindo, de diversos modos, da sua realidade pessoal consciente e livre, podem-se criar hábitos de consumo e estilos de vida objectivamente ilícitos e frequentemente prejudiciais à sua saúde física e espiritual” (CA 36).

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