divórcio ou casamento eterno?...

2009-12-19

CinV (72) Liberdade

Continuando no nº 24 da Spe Salvi, lá encontramos o que significa “o convite à liberdade”.

Um dos aspectos é a sua relação com as estruturas: “O recto estado das coisas humanas, o bem-estar moral do mundo não pode jamais ser garantido simplesmente mediante as estruturas, por mais válidas que estas sejam”.
Efectivamente as estruturas sociais, sejam de que tipo forem, são sempre um meio, um instrumento e nunca um fim. O que parece uma evidência nem sempre é assim entendido, na nossa sociedade e também na própria Igreja. Por exemplo, acontece que muitos militantes católicos absolutizam os seus grupos ou movimentos, ignorando os outros, acabando por ficar desenquadrados, qual gueto, da comunidade que é a Igreja-Comunhão. Já o Concílio alertava para esse perigo: “As associações não têm em si o seu fim, mas devem servir à missão que a Igreja tem de cumprir para com o mundo. A sua força apostólica depende da conformidade com os fins da Igreja e do testemunho cristão e espírito evangélico de cada um dos membros e de toda a associação” (AA 19).
Todos concordamos com a existência e a necessidades de estruturas, sem as quais nenhuma sociedade se podia organizar no serviço ao bem comum e à justa harmonia social. Mas se “tais estruturas são não só importantes, mas necessárias, não podem nem devem impedir a liberdade do homem”. Por isso, “se houvesse estruturas que fixassem de modo irrevogável uma determinada – (mesmo) boa – condição do mundo, ficaria negada a liberdade do homem e, por este motivo, não seriam de modo algum, em definitivo, boas estruturas”.

Daqui decorre uma consequência imediata: se são um meio e não um fim, elas devem ter, por detrás de si, valores e critérios, pois “inclusive, as melhores estruturas só funcionam se numa comunidade subsistem convicções que sejam capazes de motivar os homens para uma livre adesão ao ordenamento comunitário”.
Dando mais um passo, somos conduzidos a mais uma implicação da liberdade: “A liberdade necessita de uma convicção”, que “não existe por si mesma”, pelo que “deve ser sempre novamente conquistada comunitariamente”.

Um terceiro aspecto é que a liberdade é um bem frágil, sempre sujeita ao risco de se estilhaçar e perder toda a sua capacidade libertadora: “Visto que o homem permanece sempre livre e dado que a sua liberdade é também sempre frágil, não existirá jamais neste mundo o reino do bem definitivamente consolidado. Quem prometesse o mundo melhor, que duraria irrevogavelmente para sempre, faria uma promessa falsa (já que) ignora a liberdade humana”.

Porque, e este é um outro aspecto, se trata de um bem frágil, não só deve ser continuamente cuidada e conservada, mas também “deve ser incessantemente conquistada para o bem. A livre adesão ao bem nunca acontece simplesmente por si mesma”. Necessita de esforço, luta e, portanto de uma educação adequada.

O Papa aqui não o refere, mas a liberdade apresenta três dimensões constitutivas: a autonomia, que significa a liberdade de escolher; a imunidade, isto é, estar livre de qualquer coacção externa; e a “capacitação”, ou por outras palavras, a capacidade de acção, de escolha, pois, como já referi, a vida é sempre feita de escolhas, boas, más ou indiferentes.

Fecharia este parêntese, com um aviso de João Paulo II: “Nos nossos tempos, algumas vezes julga-se, erroneamente, que a liberdade é fim em si mesma, que cada homem é livre na medida em que usa da liberdade como quer, e que para isto é necessário tender-se na vida dos indivíduos e das sociedades. Pelo contrário, a liberdade só é um grande dom quando dela sabemos usar conscientemente, para tudo aquilo que é o verdadeiro bem. Cristo ensina que o melhor uso da liberdade é a caridade, que se realiza no dom e no serviço” (RH 21).
E cá estamos de novo no dom e no serviço, no qual a caridade se realiza.

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