As poupanças da Saúde
Sou um doente de cancro que há mais de quatro anos frequenta a Ortopedia B dos HUC (Hospital Universitário de Coimbra). Não posso dizer que passei lá os momentos mais agradáveis da minha vida, mas posso afirmar com toda a convicção que encontrei lá sempre, da parte de todos os “servidores” desde o Director, Médicos, Enfermeiros, Administrativos e Auxiliares, para lá do bom e cuidadoso tratamento clínico, a melhor dedicação, carinho e amor à pessoa do doente. Sempre há um sorriso, uma laracha, uma anedota, um estímulo a estarmos bem dispostos. Quando, numa das minhas estadias, entornei, a meio da noite, um urinol quase cheio e foi preciso fazer toda a cama de lavado, lá veio, embrulhado num sorriso, “não se preocupe, estamos cá para isto!”.
Mesmo quando não estou internado (felizmente tenho intervalos, mais ou menos alargados, em casa, o que é muito mais agradável) lá vou todos os quinze dias para pedir duas seringas de heparina. E, no meio de tanta azáfama, há sempre alguém que interrompe o que está a fazer para preparar as seringas.
Não quero endeusar ninguém, até porque em todo o lado há bons e maus, embora nuns sítios mais que noutros, mas sinto-me na obrigação de dizer estas palavras introdutórias.
É que nestas minhas andanças por lá e pela leitura de jornais tive conhecimento de que estão a ser implementadas algumas restrições. Espero que elas não ponham em causa a centralidade da pessoa do doente.
Sei que a situação financeira do país obriga a contenções de custos, nomeadamente na Saúde. Mas também sei que infelizmente algumas Administrações e chefias intermédias dão prioridade à ”redução de camas”, ao corte nos medicamentos, à desorganização de Serviços com grande qualidade assistencial construídos, com muita dedicação ao longo de vários anos.
A racionalização dos custos tem de passar obrigatoriamente por uma melhor gestão dos recursos humanos e técnicos e reorganização dos Serviços de modo a aumentar a produtividade e eficiência, a diminuir o recurso a horas extraordinárias, mesmo, que para isso, tenham de ser afrontados lobbies “intocáveis”, a evitar desperdícios, como, por exemplo, a diminuição de consumo energético, um maior cuidado na utilização do material, a substituição do papel pelo suporte informático ou até da água engarrafada pela água da torneira.
Há outras situações, que, podendo não ter um grande impacto económico, não só põem em causa a credibilidade das medidas tomadas, mas também porque, partindo de pessoal dirigente, servem de justificação a uma não colaboração colectiva, sem a qual nenhuma medida pode ser eficaz. Por exemplo, a atitude de um administrador ou um director de serviço, acabado de nomear, que gasta balúrdios na compra de mobiliário novo para o seu gabinete que já encontrava condignamente apresentável, ou na aquisição de novos carros.
As nossas derrapagens económicas e éticas e a falta de qualidade de serviços prestados são também fruto da incompetência de muitas das chefias, a todos os níveis. Por isso gostaria de referir uma conversa que, há já alguns anos, tive em Lisboa, com alguém conhecedor destes meios. Queixava-me eu dos “jobs for boys” e ele, com sorriso irónico, respondeu-me: “Pois os governos são muito acusados disso, mas da minha experiência e da de outros amigos, os principais responsáveis por essas nomeações, e algumas envolvem pessoas bem incompetentes, não são tanto os Governos mas muito mais a Maçonaria e a Opus Dei, que dividem, equitativamente entre si, os “tachos” mais apetecíveis e poderosos”.
Abri a boa de parolo ingénuo, mas depois fui vendo as nomeações mais sonantes e tentar saber qual o seu partido e verifiquei que muitas vezes não joga “a bota coma perdigota”.
E por aqui me fico, porque não sei como denunciar este escândalo. Porque se fossem só os governos nós podíamos castigá-los pelo voto, mas, se são essas seitas que não concorrem directamente às eleições, como é que os podemos pôr fora da corrida carreirista?
2 Comentários:
Sr. Zé Dias admiro a sua coragem e a sua sabedoria.
Muita saúde para si e para os seus.
Mantenha o seu Blog como sempre informando e lutando para que haja justiça social.
22/7/10 15:57
Esta é uma luta que tem de ser de todos. Cada um no seu espaço de vida e de poder. É um tempo em que todos somos chamados a ser realmente honestos, transparentes e verdadeiramente empenhados em mudar de vida para mudar a vida.
Um grande abraço pelo apoio e boas férias.
26/7/10 14:35
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