divórcio ou casamento eterno?...

2006-03-20

Gripe das aves

E já agora deixo também um comentário que fiz sobre a gripe das aves que acabei de enviar para a minha rubrica "Sinais" na revista Além-mar.
Já várias vezes anunciada como uma grande pandemia, a gripe das aves vai-se estendendo por toda a terra, de modo sorrateiro mas persistente. Entretanto, como os números catastróficos, pelo menos por agora (felizmente) não se cumpriram, vamos todos interiorizando que afinal se tratou de falso alarme e que nada de muito grave irá acontecer. A vida continua e não vale a pena estarmos muito preocupados. Os governos é que devem estar atentos e tomar as devidas precauções. Para isso são governo…
Normalmente acontece sempre o mesmo. Em vez de unirmos esforços e procurar atacar na origem estes focos malignos, vamos indo à velocidade de cruzeiro, na esperança de que isto só aconteça aos outros, aos países sub-desenvolvidos, socialmente mal preparados, sem grandes estruturas sanitárias. Nós os evoluídos do Norte temos laboratórios sofisticados, hospitais bem apetrechados, investigadores bem preparados, médicos muito competentes que certamente vencerão esta batalha, quando ela nos bater à porta. E esquecemo-nos de duas coisas muito simples. Também as pessoas que vivem em países cientificamente menos conseguidos são irmãos nossos com o mesmo direito à saúde e à qualidade de vida que nós (argumento altruísta). As doenças, especialmente as deste tipo, não escolhem pobres nem ricos, não fazem opção de pessoas e, portanto, se nós atacarmos em força a doença enquanto ela anda entre os mais pobres estamos a evitar que ela nos bata à porta (argumento egoísta). Ambos os argumentos são duas faces da solidariedade com os outros que pertencem ao mesmo e único género humano de que também nós fazemos parte: por um lado, ajudamo-los em momentos difíceis; por outro, ao combatermos a doença não só nos defendemos a nós como defendemos todos os outros de novas situações futuras.
Além disso, acusar as aves de migração, principais vectores do vírus, como únicas culpadas é uma boa desculpa para os nossos comportamentos irresponsáveis. Os vírus sempre existiram e há quem diga que a história da humanidade é a história da luta entre os vírus e os homens. Por isso, muitos hoje afirmam que esta erupção dos vírus resulta sobretudo do desequilíbrio que as nossas relações com o meio ambiente têm causado. Não são só as perturbações climatéricas; é todo o ecossistema que é afectado e com consequências imprevisíveis. Por outro lado, há hoje quem acuse os vendedores clandestinos de carne de, com a única mira no lucro, nem sempre se preocuparem com as condições sanitárias das aves e portanto serem também um grande factor de risco. Ainda recentemente vimos e lemos que um ou vários produtores deixaram a céu aberto várias centenas de frangos mortos…
Finalmente, é altura de todos percebermos que já não existem fronteiras neste mundo. Se as pessoas ainda se podem travar com barreiras de arame farpado e com meia dúzia de balas, os vírus e outros agentes patogénicos andam por onde querem e atravessam as fronteiras seja através das aves, das correntes atmosféricas ou à velocidade dos aviões de carreira sem precisarem de mostrar o passaporte e sem serem vistos por detectores de metais ou de droga.
Hoje somos todos interdependentes, sem fronteiras nem limites. E, como dizia João Paulo II, à interdependência só se pode responder com a “atitude moral e social e a "virtude" (que) é a solidariedade. Esta não é um sentimento de compaixão vaga ou de enternecimento superficial pelos males sofridos por tantas pessoas, próximas ou distantes. É pelo contrário, a determinação firme e perseverante de se empenhar pelo bem comum; ou seja, pelo bem de todos e de cada um, porque todos nós somos verdadeiramente responsáveis por todos” (SRS 38).

2 Comentários:

Blogger CA disse...

O grande risco é que o vírus "aprenda" a transmitir-se de pessoa a pessoa. E, como os pobres são nossos tão humanos como nós, o vírus poderá usá-los para essa aprendizagem.

24/3/06 10:18

 
Blogger Zé Dias disse...

Penso que só os humanos são capazes de discriminar pessoas. Os virus ainda não chegaram a esse grau de "desenvolvmento"...

24/3/06 17:32

 

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