CinV (21) Desafio para a Igreja
Bento XVI, no nº 9, chama a atenção para duas realidades que a Igreja é chamada a proclamar. Tem consciência de como hoje é especialmente difícil esta proclamação. Por isso fala de “um grande desafio para a Igreja num mundo em crescente e incisiva globalização”.
Em primeiro lugar trata-se da falta de ética nas relações entre as pessoas e os povos sem a qual nenhum desenvolvimento pode ser autêntico: “ O risco do nosso tempo é que, à real interdependência dos homens e dos povos, não corresponda a interacção ética das consciências e das inteligências, da qual possa resultar um desenvolvimento verdadeiramente humano”.
João XXIII já destacara esse “sinal dos tempos”, sem fazer referência à sua valoração moral, ficando-se pela necessidade de estar atento a este facto de modo a que se tirassem consequências em defesa das pessoas e dos povos: “Dada a interdependência cada vez maior entre os povos, não é possível que entre eles reine uma paz durável e fecunda, se o desnível das condições económicas e sociais for excessivo” (MM 156; cf. MM 49; 199).
“Ao mesmo tempo, cresce a interdependência entre as economias nacionais. Estas entrosam-se gradualmente umas nas outras, quase como partes integrantes de uma única economia mundial. O progresso social, a ordem, a segurança e a paz em cada comunidade política estão em relação vital com o progresso social, com a ordem, com a segurança e com a paz de todas as demais comunidades políticas” (PT 129).
Foi João Paulo II quem fez uma avaliação moral desta “crescente consciência da interdependência entre os homens e os povos” considerando-a como “um valor positivo e moral”, porque “o facto de os homens e as mulheres, em várias partes do mundo, sentirem como próprias as injustiças e as violações dos direitos humanos cometidas em países longínquos, que talvez nunca visitem, é mais um sinal de uma realidade interiorizada na consciência, adquirindo assim uma conotação moral”. E, se estamos no campo da moral, a resposta só poderá também vir desse campo: “Quando a interdependência é reconhecida assim, a resposta correlativa, como atitude moral e social e como «virtude», é a solidariedade. Esta, portanto, não é um sentimento de compaixão vaga ou de enternecimento superficial pelos males sofridos por tantas pessoas próximas ou distantes. Pelo contrário, é a determinação firme e perseverante de se empenhar pelo bem comum; ou seja, pelo bem de todos e de cada um, porque todos nós somos verdadeiramente responsáveis por todos” (SRS 38).
Em segundo lugar, Bento XVI vem repetir uma ideia já muito presente na DSI, a de que o desenvolvimento autêntico não pode ser apenas técnico: “A partilha dos bens e recursos, da qual deriva o autêntico desenvolvimento, não é assegurada pelo simples progresso técnico e por meras relações de conveniência, mas pelo potencial de amor que vence o mal com o bem (cf. Rm 12, 21) e abre à reciprocidade das consciências e das liberdades”.
Finalmente, recorda uma outra ideia muito presente nos últimos documentos do Magistério: “A Igreja não tem soluções técnicas para oferecer e não pretende «de modo algum imiscuir-se na política dos Estados»; mas tem uma missão ao serviço da verdade para cumprir, em todo o tempo e contingência, a favor de uma sociedade à medida do homem, da sua dignidade, da sua vocação”. Em nota de roda-pé, faz referência a vários documentos, nos quais falta o que me parecia o mais importante e que vou citar: “A Igreja não tem soluções técnicas que possa oferecer para o problema do subdesenvolvimento enquanto tal. Com efeito, ela não propõe sistemas ou programas económicos e políticos, nem manifesta preferências por uns ou por outros, contanto que a dignidade do homem seja devidamente respeitada e promovida e a ela própria seja deixado o espaço necessário para desempenhar o seu ministério no mundo” (SRS 41).
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