divórcio ou casamento eterno?...

2009-08-26

CinV (13) O que é a verdade?

Porque vivemos "num contexto social e cultural que relativiza a verdade” e que origina “desvios e esvaziamento de sentido do que é a caridade” (2), o Papa dedica a Introdução a mostrar a íntima ligação que tem de haver (há) entre caridade e verdade.
A verdade é um dos conceitos mais fecundos na história do pensamento ocidental, desde os filósofos gregos e todos os seus sucessores aos teólogos cristãos desde os tempos apostólicos.
Para F. Torralba, “o filósofo busca a verdade do ser através do lógos, ou mais especificamente, através do dia-lógos, enquanto que a teologia procurar decifrar o sentido do mundo, da história e do ser humano a partir da palavra que Deus revelou sobre si mesmo na sua comunhão gratuita com o ser humano”.
Para Bento XVI, “a verdade é «logos» que cria «dia-logos» e, consequentemente, comunicação e comunhão. A verdade, fazendo sair os homens das opiniões e sensações subjectivas, permite-lhes ultrapassar determinações culturais e históricas para se encontrarem na avaliação do valor e substância das coisas. A verdade abre e une as inteligências no logos do amor: tal é o anúncio e o testemunho cristão da caridade” (4).
O cristão sente sempre a verdade como a Palavra com que Jesus se definiu: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14,6). Mas não ignora uma sua outra “palavra”: o seu silêncio perante a pergunta de Pilatos: “O que é a verdade?” (Jo 18,38). Sempre me interroguei por que razão Jesus, que sempre tinha uma resposta tão sábia como desconcertante para todas as perguntas por mais capciosas que elas fossem, aqui tenha ficado calado. Como este seu silêncio não pode ser entendido como uma manifestação de ignorância, fica uma outra alternativa. Jesus quis deixar a pergunta sem resposta para nos desafiar a cada um de nós a descobrir a verdade, a descobrir a sua verdade. Nós só podemos ser autenticamente pessoa se formos fiel à nossa verdade, à nossa razão de ser, ao nosso projecto de pessoa. É, aliás, o que indica o Papa: “O amor — «caritas» — é uma força extraordinária, que impele as pessoas a comprometerem-se, com coragem e generosidade, no campo da justiça e da paz. É uma força que tem a sua origem em Deus, Amor eterno e Verdade absoluta. Cada um encontra o bem próprio, aderindo ao projecto que Deus tem para ele a fim de o realizar plenamente: com efeito, é em tal projecto que encontra a verdade sobre si mesmo e, aderindo a ela, torna-se livre (cf. Jo 8, 22)” (1).
Parece-me muito importante esta articulação da caridade com a verdade (da pessoa). Caridade não pode ser só amar a(s) pessoa(s) de qualquer maneira. Temos de amar as pessoas na sua verdade, isto é, naquilo que elas são chamadas a ser de acordo com o projecto que lhes compete. Olhar a caridade desta perspectiva é perceber que não se pode amar sempre da mesma maneira. Na catequese aprendemos que devemos amar a todos, mas talvez ninguém nos diga que devemos amar a todos... mas segundo as suas diferentes maneiras e circunstâncias. O cristianismo resume-se ao amor, todos o dizem. Mas como amar, hoje, na família, no trabalho, na política, no lúdico, na luta pela justiça, na solidariedade com os mais necessitados? Em cada um destes casos, o amor terá de ser vivido de modos diferentes, deverá ser vivido respeitando as palavras do Papa: caridade na verdade.
Esta afirmação de Bento XVI torna-se particularmente oportuna, porque amar é uma atitude muito mais complexa do que nos parece, pois tem de começar por responder a uma pergunta tão simples como dramaticamente comprometedora: “Como vou amar esta pessoa (ou este povo) concreta nestas suas circunstâncias concretas?”

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