divórcio ou casamento eterno?...

2010-02-16

O Papa em Portugal

A propósito da vinda a Portugal de Bento XVI publiquei na minha coluna habitual do Correio de Coimbra a reflexão que reproduzo agora aqui.

FALTAM CEM DIAS

Ouvi dizer que Bento XVI vem a Portugal daqui a uns cem dias. Quero crer que as comunidades estão a preparar-se. É uma crença periclitante, pois penso no que se passa com as Visitas Pastorais que o Bispo faz às paróquias. Deitamos muitos foguetes, organizamos encontros, mas… que preparação espiritual e doutrinal se faz? Que compromissos pessoais e comunitários delas resultam? Conheço bem a velha cassete desculpabilizadora de que os “frutos espirituais não se vêem e o Espírito trabalha no silêncio”. Certo! Mas discordo do argumento. Se não se vêem resultados, como sabemos que eles existem? Dir-me-ão que sou um “homem de pouca fé”. Aceito. Mas se não há sinais visíveis no nosso estilo de via, afinal o que fica: haverá mesmo um “trabalho espiritual”? Não é pelos frutos que se conhece a árvore? “Não se esconde a candeia debaixo do alqueire”, mas põe-se à vista de todos para que “os homens vendo as vossas boas obras glorifiquem o vosso Pai que está no Céu” (Mt 5, 25-16). Bem sei que “é um o que semeia e outro o que colhe” (Jo 4,37), mas estamos mesmo a semear alguma coisa?
A visita do Papa não é uma visita, mas um acontecimento: é uma oportunidade rara para reflectir e nos reflectirmos. O Papa vem e pode juntar muita gente, mas o que fica no “dia seguinte” em nós, nas nossas comunidades, na Igreja e na sociedade em Portugal?
A Palavra de domingo passado, além de enaltecer a caridade, lançava-nos um outro grande desafio: o de ser profeta. “Cinge os teus rins e levanta-te para ires dizer tudo o que Eu te ordenar” (Jer 1,5) e “passando pelo meio das pessoas, Jesus seguiu o seu caminho” são a missão do profeta a que todos, individual e colectivamente, somos chamados. Destas palavras fiz uma ponte para a vinda do Papa. Ser profeta é a nossa vocação “desde o ventre materno”. E temo-la falhado no mundo de hoje, que tanto precisa de uma palavra e de um testemunho credíveis de esperança, de sentido de vida, de afirmação de que nenhum crise é definitiva mas, antes, uma ocasião para tentar “uma nova terra”, com espaço e acolhimento para todos, pessoas e povos.
Mas também temos falhado na missão de profetas dentro da Igreja: não só os leigos, mas também os leigos. Assim, devíamos lembrar o Papa para que pedisse contas das recomendações que fez aos nossos Bispos e apresentar-lhe as dificuldades e propostas, a partir da nossa condição de baptizados, superando o nosso complexo de inferioridade frente ao clero, pois também nós amamos a Igreja e queremos que ela seja cada vez mais um rosto sedutor de Jesus Cristo. Devemos, por isso, exigir que a Comunhão se torne efectiva e não apenas formal sem qualquer conteúdo estruturante da comunidade cristã: por exemplo, que os Conselhos Pastorais sejam assumidos seriamente por todos como o principal órgão da comunidade, que participem efectivamente na definição, programação e avaliação dos planos pastorais. Precisamos de ver garantido o direito fundamental à Eucaristia, sem a qual não pode existir nenhuma comunidade cristã (PO 6): para isso são necessárias medidas inovadoras e ousadas que não se resumam a manter fórmulas seculares passadistas. Necessitamos de uma moral conjugal e sexual vista à luz dos novos contextos e não apenas por celibatários sexagenários que pouco sabem da prática da família de hoje nas suas várias vertentes. Queremos uma catequese bem elaborada e adaptada aos dias de hoje: mesmo a sua vertente sacramental (e onde está a doutrina conciliar ou a DSI?), é tão pobre especialmente quanto ao Baptismo, pelo qual “somos incorporados em Cristo, constituídos em Povo de Deus e tornados participantes da função sacerdotal, profética e real de Cristo” (LG 31), e ao Matrimónio que, num “processo gradual e contínuo”, exige uma preparação remota, próxima e imediata (FC 66-68) e um especial “cuidado pós-matrimonial” numa sociedade que lhe é tão centrífuga e num contexto teológico de tão difícil compreensão do “grande mistério do amor de Deus”, de que o Matrimónio é sinal, pois “só na condição de se assumirem como partícipes de tal amor e desse “grande mistério”, é que os esposos podem amar “até ao fim”: ou se tornam partícipes dele, ou então não conhecem plenamente o que seja o amor nem quanto sejam radicais as suas exigências” (Carta às Famílias, 19). Precisamos de padres, que irradiem fé, esperança e amor de Deus, sejam acolhedores e servidores e não donos da comunidade e que “a sua vida seja uma quotidiana realização da "caridade pastoral" (de Jesus): sente compaixão pelas multidões porque estão cansadas e esgotadas como ovelhas sem pastor; procura as dispersas e tresmalhadas e festeja o tê-las reencontrado, recolhe-as e defende-as, conhece-as e chama-as uma a uma pelo seu nome, condu-las aos pastos verdejantes e às águas refrescantes, para elas põe a mesa, alimentando-as com a Sua própria vida” (PDV 22).
Haverá espaço para os leigos falarem ao Papa? E caso haja, quererão dizer-lhe estas coisas ou preferirão dizer-lhe o “politicamente correcto”, tornando-se “mais papistas que o Papa”?
Mas também, como profetas, temos o dever de nos comprometermos perante o Papa a ser testemunhas sedutoras de Jesus Cristo em todos os âmbitos da vida social, a contribuir para tornar as nossas celebrações eucarísticas um sinal irradiante da beleza amorosa do nosso Deus e “apetecíveis” sobretudo para os mais novos, a ser, como comunidade, o agente principal do exercício da caridade, com a convicção profunda de que “para a Igreja, a caridade não é uma espécie de actividade de assistência social que se poderia mesmo deixar a outros, mas pertence à sua natureza, é expressão irrenunciável da sua própria essência” (DCE 25).
Vamos a isto? Cem dias talvez ainda cheguem para tomarmos estas decisões que vão implicar profundas mudanças na Igreja e nos nossos comportamentos individuais e sociais.

3 Comentários:

Anonymous TIAGOFELICIANO disse...

NÃO QUEREMOS O PAPA EM PORTUGAL NEM PAGAR DOS NOSSOS IMPOSTOS A SUA VINDA A IGREJA QUE PAGE!! QUEM QUER QUE ELE VENHA SÃO OS CATOLICOS\IGREJA GRANDE PARTE DA POPULAÇÃO DE PORTUGAL TALVEZ MAIORIA NÃO QUER A SUA VINDA A DECISÃO DA CAMARA DE LISBOA FOI A MAIS CORRETA. ÁMEN IRMÃ(ão) ;)

11/3/10 19:54

 
Blogger Zé Dias disse...

Ainda bem que há muitas opiniões sobre este e outros assuntos. E até posso dar-lhe razão, sem grandes prblemas de consciência.
De qualquer maneira, se a vinda de Bento XVI a Portugal contribuir para que os católicos sejam mlehores cidadãos, mais interventivos na construção de uma sociedade mais justa, mais solidária e mais humana, penso que prrestava um grande serviço ao País, a todo o País, aos católicos e os não católicos.
Um abraço, irmão.

13/3/10 23:44

 
Anonymous Nuno disse...

Os nossos impostos não devem ser usados para suportar as visitas oficiais dos líderes religiosos ao nosso país. Tal não se tem verificado, e bem, nas visitas de outros lideres religiosos (por exemplo Dalai Lama). Sendo o estado português um estado laico, ao suportar os custos da visita do Papa a Portugal teria de suportar os custos com todas as outras visitas de outros líderes religiosos ao nosso país, porque se poderia sempre argumentar que "prestava um grande serviço ao País, a todo o País, seguidores ou não dessa crença religiosa"!

28/3/10 11:49

 

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