divórcio ou casamento eterno?...

2010-04-01

Quinta-feira que é santa

Para os católicos esta semana tem um especial significado.
Nesta quinta-feira comemoramos o último momento de verdadeira amizade que Jesus viveu neste mundo, à mesa com os seus discípulos e amigos mais íntimos. Pouco depois, começava o verdadeiro calvário, com os vai-vens de Herodes para Pilatos, o escárnio dos soldados e das autoridades, a flagelação, a violenta e dolorosa via sacra a caminho do Gólgota para ser pregado na Cruz.
Hoje costumo recordar a Última Ceia, especialmente um dos seus momentos mais significativos. Refiro-me a “um” episódio que os evangelistas contam de modo muito diferente. E é essa diferença que alimenta a minha fé e as consequências dela decorrentes.

Os Sinópticos (Mateus, Marcos e Lucas) narram a “instituição da Eucaristia”, com palavras muito próximas das que hoje repetimos nas celebrações eucarísticas: a partilha do pão e do vinho, com a garantia de que passou a ser o seu Corpo e Sangue que ia ser entregue por todos nós. E termina com “não beberei mais deste produto da videira até ao dia em que o hei-de beber de novo convosco no Reino de meu Pai”. Não são antes no recomendar: “Fazei isto em Minha memória” (Lc. 22,19).
O quarto evangelista, João, faz um relato totalmente diferente. Descreve a Ceia num âmbito muito mais íntimo e mais “profundo” onde os sentimentos de unidade e da partida que não é uma partida definitiva são desenvolvidos em vários tons e variações sobre o amor. No centro deste hino ao amor mútuo, João coloca o “lava-pés”. Depois de lavar os pés ao discípulos, disse-lhes: “Compreendeis o que vos fiz? Vós chamai-me Senhor e Mestre e dizeis bem, visto que o sou. Ora, se Eu vos lavei os pés, sendo Senhor e Mestre, também vós deveis lavar os pés uns aos outros. Dei-vos o exemplo para que, como Eu fiz, façais vós também” (Jo 13,12-15).

Se João conta o lava-pés em vez da instituição da Eucaristia é porque estes dois acontecimentos são apenas um. Eucaristia = lava-pés? É estranho e até herético para muitos. E é por causa dessa estranheza ou quase heresia, que nós temos o cristianismo tão light, tão sem calorias, tão sem substância. Como dizia João Crisóstomo: “Porque o mesmo que disse: "Este é o meu corpo" e com a sua palavra firmou a nossa fé, é o mesmo que disse: "Vistes-me com fome e não me destes de comer". Portanto, não pode haver Eucaristia sem lava-pés nem lava-pés autêntico sem Eucaristia. Porque a Eucaristia não acaba como o ”Ide-vos”. É realmente a partir daí que nós mostramos a autenticidade com que a celebramos. Infelizmente elevamos muito alto a Eucaristia e bem porque sem Eucaristia não há Igreja e sobretudo porque a Eucaristia é o próprio Cristo; mas deixamos os outros, especialmente os pobres, tão baixo, apesar de também eles serem o próprio Cristo.
Deixo uma palavra final, que já devo ter repetido mais vezes. Mas é sempre bom repeti-la e sobretudo meditá-la:
”Há ainda um ponto para o qual queria chamar a atenção, porque sobre ele se joga numa medida notável a autenticidade da participação na Eucaristia, celebrada na comunidade: é o impulso que esta aí recebe para um compromisso real na edificação duma sociedade mais equitativa e fraterna. Na Eucaristia, o nosso Deus manifestou a forma extrema do amor, invertendo todos os critérios de domínio que muitas vezes regem as relações humanas e afirmando de modo radical o critério do serviço: «Se alguém quiser ser o primeiro, há-de ser o último de todos e o servo de todos» (Mc 9,35). Não é por acaso que, no Evangelho de João, se encontra, não a narração da instituição eucarística, mas a do «lava-pés» (cf. Jo 13,1-20): inclinando-Se a lavar os pés dos seus discípulos, Jesus explica de forma inequívoca o sentido da Eucaristia. S. Paulo, por sua vez, reafirma vigorosamente que não é lícita uma celebração eucarística onde não resplandeça a caridade testemunhada pela partilha concreta com os mais pobres (cf. 1Cor 11,17-22.27-34).” (João Paulo II; MND 28)

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