divórcio ou casamento eterno?...

2010-11-23

“Luz do Mundo” de Bento XVI

Este livro-entrevista escrito pelo jornalista alemão Peter Seewald, que deve chegar hoje às livrarias, é já famoso pelas suas palavras sobre o uso do preservativo, um tema que os jornalistas adoram.

Pelo que se sabe o Papa, que se assume como “um pobre mendigo frente a Deus”, aborda muitos temas.
Considera necessário denunciar com força a verdadeira ameaça diante da qual nos encontramos: que a tolerância seja abolida em nome da própria tolerância.
A serpente do comércio e do consumo de droga, que envolve o mundo, é um poder do qual nem sempre conseguimos ter uma ideia adequada. Destrói os jovens, destrói as famílias, leva à violência e ameaça o futuro de nações inteiras. Também esta é uma terrível responsabilidade do Ocidente.
Apesar de não ter sido apanhado de surpresa, a pedofilia dos padres provocou-lhe um choque enorme: “Ver o sacerdócio de repente sujo deste modo, e com isso a própria Igreja Católica, foi difícil de suportar”.
Paulo não entendia a Igreja como instituição, com organização, mas como organismo vivente, no qual todos trabalham um pelo outro e um com o outro, unidos a partir de Cristo.
Ser cristão é em si mesmo algo vivo, moderno, que atravessa toda a modernidade, formando-a e moldando-a, e, portanto, em certo sentido realmente abraçando-a. Por isso, é importante que tentemos viver e conceber o cristianismo de tal modo que assuma a modernidade boa e correcta.
Repete o pouco fundamentado argumento de que “a Igreja não tem a faculdade de ordenar as mulheres”: não se trata de não querer, mas de não poder.

Mas o livro vai ficar possivelmente conhecido pelo facto de um Papa admitir pela primeira vez o uso do preservativo: “Concentrar-se só no preservativo quer dizer banalizar a sexualidade e esta banalização representa precisamente o motivo pelo qual muitas pessoas já não vêem na sexualidade a expressão de seu amor, mas só uma espécie de droga, que se fornecem por sua conta. Por este motivo, também a luta contra a banalização da sexualidade faz parte do grande esforço para que a sexualidade seja valorizada positivamente e possa exercer o seu efeito positivo no ser humano na sua totalidade. Pode haver casos justificados singulares, por exemplo, quando uma prostituta utiliza um preservativo, e este pode ser o primeiro passo para uma moralização, um primeiro acto de responsabilidade para desenvolver de novo a consciência sobre o fato de que nem tudo está permitido e de que não se pode fazer tudo o que se quer. No entanto, este não é o verdadeiro modo para vencer a infecção do HIV. É verdadeiramente necessária uma humanização da sexualidade”.
Já alguns bispos e cardeais o tinham afirmado: entre nós, D. Manuel Martins, quando era bispo de Setúbal; em 2005, cardeal G. Cottier afirmava: “em situações particulares, e penso em meios onde circula a droga ou há uma grande promiscuidade humana e muita miséria, como ocorre em algumas zonas da África e Ásia, nesses casos, o uso do preservativo pode ser considerado como legítimo”.
O P.e Lombardi, director da Sala de Imprensa da Santa Sé, apressou-se a acrescentar que o raciocínio do Papa “não pode ser definido como uma mudança revolucionária”. É evidente que o Papa e a Igreja têm obrigação de proclamar “o exercício não desordenado” da sexualidade. Mas uma coisa é condenar a libertinagem pura e dura e outra é não considerar as situações “inevitáveis” em que a vida corre perigo. Nestes casos, a doutrina não pode sobrepor-se à vida, o primeiro direito fundamental da pessoa, até porque o “sábado e feito para o Homem e não o Homem para o sábado”.

Mas há uma outra palavra do Papa que queria destacar: “As perspectivas da Humanae Vitae continuam sendo válidas, mas outra coisa é encontrar caminhos humanamente praticáveis. Creio que haverá sempre minorias intimamente convencidas da exactidão dessas perspectivas e que, vivendo-as, ficarão plenamente satisfeitas de modo que poderão ser para outros um fascinante modelo a seguir. Somos pecadores. Mas não deveríamos assumir este fato como uma instância contra a verdade, quando essa alta moral não é vivida. Deveríamos buscar fazer todo o bem possível e apoiar-nos e suportar-nos mutuamente” E logo acrescenta: “Expressar tudo isso também desde o ponto de vista pastoral, teológico e conceitual, no contexto da actual sexologia e pesquisa antropológica, é uma grande tarefa à qual é necessário se dedicar mais e melhor”.

Vamos ver como vai o Papa e a Igreja concretizar esta grande tarefa à qual se deve dedicar mais e melhor. Até porque, já João XXIII fizera apelo a “um renovado esforço científico e técnico” no domínio da demografia com uma referência implícita à regulação de nascimentos (“as próprias fontes da vida): “Por isso, a solução fundamental do problema (demográfico) não deve procurar-se em expedientes que ofendem a ordem moral estabelecida por Deus e atacam as próprias fontes da vida humana, mas num renovado esforço científico e técnico, por parte do homem, no sentido de aperfeiçoar e estender cada vez mais o seu domínio sobre a natureza” (MM 188).
O Concílio, por sua vez, foi muito mais explícito: “Os especialistas das ciências, principalmente biológicas, médicas, sociais e psicológicas, podem contribuir em muito para o bem do matrimónio e da família e para a paz das consciências se, pela convergência dos seus estudos, se aplicarem a esclarecer mais profundamente as diversas condições que favorecem uma sã regulação da procriação humana.” (GS 52d).

Portanto, têm a palavra os cientistas, os moralistas, os pastoralistas e também nós os leigos que somos os primeiros a sofrer na pele os efeitos de uma doutrina que parece não ter ainda suficientes bases antropológicas.

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