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2011-01-11

Perseguições Religiosas

A denúncia doPapa, na Mensagem para o Dia Mundial para a Paz, de que as comunidades cristãs são as mais perseguidas neste momento, no que foi acompanhado até por por não-cristãos, serviu de tema de fundo para a minha habitual crónica "jornalística", que quero aqui partilhar com os meus leitores.

OS ATAQUES AO CRISTIANISMO
“Os cristãos são, actualmente, o grupo religioso que padece o maior número de perseguições devido à própria fé” diz Bento XVI, na sua Mensagem para o Dia da Paz.
Para um não crente poderá parecer mais uma daquelas afirmações “queixinhas” de um líder religioso. Mas não é, pois BHL (Bernard-Henry Lévy), talvez o mais controverso e mediático dos "novos filósofos", um não-cristão, denuncia a "ola de fobia" (onda de fobia), que ocorre por todo o mundo, sob a forma de ataques violentos, perseguições e morte, concluindo com duas perguntas: “É admissível o assassinato quando as vítimas são os fiéis do "papa alemão"? É permitido oprimir, humilhar, torturar em nome de outra guerra de civilizações, não menos odiosa que a primeira? Não. Nestes tempos devemos defender os cristãos”.
Estamos, pois, a assistir a uma cruel perseguição aos cristãos. Isto não deve fazer-nos esquecer o que outras confissões religiosas e minorias étnicas estão a sofrer. Antes, deve sensibilizar-nos ainda mais para essas degradações da condição humana. Simplesmente, neste momento, há uma perseguição violenta e cruenta contra os cristãos e não parece ser objecto de grandes preocupações, como o mesmo BHL acusa noutro artigo: “Enquanto o anti-semitismo é considerado um crime e os preconceitos anti-árabes ou anti-ciganos são estigmatizados, a violenta fobia anticristã que percorre o mundo não parece ter qualquer resposta”.
Os cristãos não deviam estranhar esta situação, de que o próprio Jesus foi vítima e que nos apontou até como sinal da autenticidade cristã: “Felizes sereis quando vos insultarem, vos perseguirem e, mentido, disserem todo o género de calúnias, por minha causa. Exultai e alegrai-vos, porque grande será nos Céus a vossa recompensa” (Mt 5, 11-12). Mas esta atitude interior não justifica que não lutemos por uma sociedade em que a liberdade religiosa seja reconhecida, defendida e promovida como um direito fundamental de todos. Não somos masoquistas, mas queremos lutar pela liberdade religiosa, mesmo que isso signifique sofrimento, perseguição ou morte. Ao fazê-lo estamos a tornar a sociedade mais humana e a pessoa mais pessoa. Só com a liberdade de consciência é que a pessoa se pode realizar em plenitude. E liberdade de consciência significa que há um espaço interior que ninguém pode violar como tão bem mostra o “Dai a César o que é de César…”: os Césares não têm legitimidade para violentar a minha consciência. Nem mesmo o Magistério da Igreja, pois foi Pedro, o primeiro “chefe” da Igreja, quem definiu este “dogma” fundamental: “É mais importante obedecer a Deus do que aos homens” (Act 5,29). Aqui, Deus pode traduzir-se simplesmente por consciência (GS 16) e a frase passa a ter um valor universal, até, porque Deus “não faz acepção de pessoas” (Act 10,34).

Há, no entanto, outras formas mais subtis de perseguição ou desconsideração religiosa, como são os esforços para a “privatizar” a fé. Ora é a minha fé que marca profundamente a minha maneira de ser e de actuar. Como diz o Papa, “na liberdade religiosa exprime-se a especificidade da pessoa “ (1). Como cidadão, actuo segundo a minha mundividência, como a actuação do ateu ou do agnóstico também depende das suas munfividências. Portanto é tão legítima a dimensão pública da fé, como o é a do ateísmo ou a do agnosticismo. Além disso, poderemos ainda olhar por outra perspectiva: as religiões são também movimentos culturais, cujos contributos têm moldado as sociedades e a própria humanidade. Como recorda o Papa: “Inegável é a contribuição que as religiões prestam à sociedade. São numerosas as instituições caritativas e culturais que atestam o papel construtivo dos crentes na vida social. Ainda mais importante é a contribuição ética da religião no âmbito político. Tal contribuição não deveria ser marginalizada ou proibida, mas vista como válida ajuda para a promoção do bem comum.” (6)

Mas há uma outra “privatização da fé” mais preocupante, porque não se resolve por legislação ou por reflexões filosóficas, mas porque é interna à própria Igreja católica. Há muitos católicos que resumem a vivência da sua fé no ir à missa, mandar os filhos à catequese e dar migalhas das suas sobras para uma qualquer instituição. O seu comportamento, muitas vezes exemplar, resulta do facto de serem “boas” pessoas, cumpridores das responsabilidades familiares e profissionais e não (tanto) do seu encontro com Jesus Cristo: “No início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo” (DCE 1).
Ora Jesus disse-nos que “Não é o que diz ‘Senhor, Senhor’ que entrará no Reino dos Céus” (Mt 7,22) e que os sinais do Reino (Mt 11,4-6) decorrem dos critérios indispensáveis para entrar nele: dar pão e água, visitar os doentes e os presos, acolher os estrangeiros, … (Mt 25,34ss).
Portanto, estamos a privatizar a nossa fé, isto é, a fechá-la dentro das paredes das igrejas, sempre que não lutamos, em nome de Jesus Cristo, que vamos conhecendo pela Catequese e nos alimenta na Eucaristia, por uma sociedade mais justa, mais solidária, mais fraterna, mais humana. É isto e não vistosas procissões ou públicas vias-sacras que desprivatizam a nossa fé.
“Repensar juntos a pastoral em Portugal” é uma boa altura para responder às questões: que mudanças na Catequese e nas homilias? Que alterações na celebração da beleza do nosso Deus? Como viver e praticar a espiritualidade do samaritano a que tanto apelou Paulo VI no final do Concílio? Como ver a presença real de Jesus nos outros, especialmente nos que sofrem, nos famintos, nas prostitutas, nos drogados e em todos esses “mal-comportados” que, de um modo geral, comunidades cristãs e sociedade civil tendem a “varrer para baixo do tapete”?

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