divórcio ou casamento eterno?...

2008-07-18

Espírito Santo

A segunda razão porque amo a Igreja católica é porque acredito que ela é guiada pelo Espírito Santo. Não tenho dúvidas que Ele também guia todas as outras Igrejas. Mas eu fui “criado e educado na Igreja católica” e é a ela que procuro manter-me fiel.
Gosto muito do Espírito Santo, porque é o anarquista por excelência. As traduções portuguesas de Jo 3,9 dizem: “O vento (pneuma) sopra onde quer e tu ouves a sua voz, mas não sabes para onde vem nem para onde vai”. A Vulgata e muitos exegetas traduzem: “O Espítito (pneuma) sopra onde quer e tu ouves a sua voz, mas não sabes para onde vem nem para onde vai” (Tolentino Mendonça). É que no grego a palavra pneuma tanto significa vento como Espírito. Talvez por causa desta anarquia, o Espírito Santo fosse o grande esquecido na Igreja católica latina. Era perigoso para uma ordem estabelecida e muito regulamentada e ordenadinha. E muito perdemos com isso.
O Concílio Vaticano II veio repor as coisas e só cito duas passagens “revolucionárias”. Afinal não é só a hierarquia que é assistida pelo Espírito Santo:
A totalidade dos fiéis, que receberam a unção do Santo, não pode enganar-se na fé; e esta sua particularidade peculiar manifesta-se por meio do sentir sobrenatural da fé do Povo todo, quando este, ‘desde os Bispos até ao último dos fiéis leigos’, manifesta consenso universal em matéria de fé e costumes… Além disso, este mesmo Espírito Santo não só manifesta e conduz o Povo de Deus por meio dos sacramentos e ministérios e o adorna com virtudes, mas distribuindo a cada um os seus dons que lhe apraz, distribui também graças especiais entre os fiéis de todas as classes, as quais os tornam aptos e dispostos a tomar diversas obras e encargos, proveitosos para a renovação e cada vez mais ampla edificação da Igreja” (LG 12).
E mais: “o Espírito Santo não poucas vezes se antecipa à acção dos que governam a vida da Igreja” (AdG 29).
A propósito da importância do Espírito Santo na condução da Igreja não resisto a contar uma das histórias do Decameron, que, como é sabido, foi escrito por Bocácio, como crítica impiedosa aos costumes da Itália do século XIV. Passa-se entre dois comerciantes que se admiravam mutuamente. É a “segunda novela”, que terei de resumir dada a sua extensão.
O católico Giannotto preocupado com a salvação da alma do seu amigo judeu Abraão, insistia muito com ele para aceitar a fé cristã. Mas ele resistia a tudo. Até que um dia lhe disse: “Agrada-te que eu me faça cristão e estou disposto a fazer-te a vontade. A prova é que quero ir primeiro a Roma ver aquele a quem chamas o Vigário de Deus na terra, observar a vida que leva, as suas maneiras e igualmente a dos seus irmãos, os cardeais”.
Giannotto ficou preocupadíssimo, pois sabia dos comportamentos pouco cristãos que por lá se praticavam e tentou demovê-lo da viagem. Mas ele queria era o argumento de Roma e não desistiu. E lá foi. Viu, observou e tirou as suas conclusões. E regressou à sua terra, Paris. Uns dias depois, receoso do veredicto mas morto de curiosidade, Giannotto lá foi visitar o amigo. E ficou aflitíssimo quando ele começou a fazer o seu relato: “O que penso deles? … A meu ver, o vosso pastor e, por conseguinte, todos os outros que vêm depois dele parecem consagrar todos os esforços a reduzir a nada e a expulsar do mundo a religião cristã, de que deviam ser o alicerce e os responsáveis. Mas, como vejo que tal finalidade não foi atingida e que a vossa religião se vai estendendo dia a dia, projectando uma luz cada vez mais deslumbrante, julgo compreender que o Espírito Santo é, com toda a justiça, o seu alicerce e o seu responsável, porque ela é mais santa e verdadeira do que qualquer outra. Por isso mesmo, se me mantive surdo e insensível aos teus pedidos, recusando fazer-me cristão, digo-te agora com a maior franqueza que nada me impedirá de me converter à tua fé. Vamos, pois, à igreja e faz-me baptizar segundo os princípios habituais da vossa santa religião”.
Depois disto não valeria a pena perguntar pelo futuro da Igreja. Mas os tempos actuais sugerem que diga alguma coisa sobre isso.

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