Comunidades eclesiais (2)
Continuando...
Falta de apoio aos que se comprometem sócio-politicamente
Deixo apenas dois exemplos.
Numa das intervenções que fiz numa paróquia sobre a necessidade do compromisso sócio-político dos leigos nos vários âmbitos da actividade humana, fui surpreendido no debate pelas palavras de uma presente: Eu era delegada sindical na fábrica onde trabalhava, mas as pessoas aqui da paróquia criticaram-me tanto que eu pensei que estava errada e resolvi desistir. Mas hoje, depois do ouvir, vou voltar de novo. Parto com a certeza de que estava certa, como cristã, no meu compromisso sindical e vou retomar de novo o meu lugar.
Noutra paróquia, estava colocada à porta principal a lista de Leitores. Aconteceu que um deles aceitou ser mandatário concelhio nas eleições presidenciais por parte de Lurdes Pintasilgo. Pois mal se soube da notícia um zeloso cristão, talvez de missa diária, escreveu a letras vermelhas por cima do tal nome: “Tirei daqui este comunista”. Resta acrescentar que essa pessoa “crucificada” era não só leitora, como desempenhava outras tarefas importantes na paróquia, nomeadamente no Conselho Pastoral.
Insisto que não se deve generalizar, mas mesmo quando não há hostilidade como neste caso, há indiferença e não conheço nenhum caso onde haja um declarado apoio pastoral e teológico a essas pessoas comprometidas socialmente.
Precisamente aquelas que de mais apoio precisavam para a sua missão tão exigente.
Passividade
Mas é toda a comunidade, e não só os seus membros, que deve comprometer-se socialmente em muitas áreas e âmbitos que dizem respeito a todos. Perante esta incapacidade de assumir o protagonismo, apenas cito uma passagem verdadeiramente revolucionária de Paulo VI: “Perante situações, assim tão diversificadas, torna-se-Nos difícil tanto o pronunciar uma palavra única, como propor uma solução que tenha um valor universal. Mas isso não é ambição Nossa, nem mesmo a Nossa missão. É às comunidades cristãs que cabe analisarem, com objectividade, a situação própria do seu país e procurarem iluminá-la, com a luz das palavras inalteráveis do Evangelho; a elas cumpre o haurirem princípios de reflexão, normas para julgar e directrizes para a acção, na doutrina social da Igreja… A essas comunidades cristãs incumbe o discernirem, com a ajuda do Espírito Santo, em comunhão com os bispos responsáveis e em diálogo com os outros irmãos cristãos e com todos os homens de boa vontade, as opções e os compromissos que convém tomar, para se operarem as transformações sociais, políticas e económicas que se apresentam como necessárias, com urgência, em não poucos casos" (OA 4).
Repare-se nas seguintes passagens, verdadeiramente inesperadas num papa (admito uma excepção para João XIII):
1) O Papa acha que não deve pronunciar uma palavra única porque sabe que cada região tem os seus problemas específicos para os quais uma palavra única poderia até ser perturbadora, pois podendo ser a mais indicada para uma região, nada acrescentaria para outra e até poderia perturbar o que de bom se faz noutras.
2) O Papa diz qualquer coisa de inesperado: “Mas esta não é a nossa missão”: a missão do Papa, além de presidir à unidade na caridade, não é dizer a cada comunidade o que deve fazer, mas dar, como diz mais abaixo, “princípios de reflexão, normas para julgar e directrizes para a acção”, que cada comunidade é chamada a ter em conta na avaliação que ela própria deve fazer da sua realidade concreta. É a cada comunidade que cabe a iniciativa e o protagonismo, não é ao Papa.
3) Cada comunidade deve socorrer-se, primeiramente, também das próprias ciências “profanas” para poder fazer uma análise objectiva da realidade. Só depois deve iluminar a realidade com as palavras do Evangelho e da doutrina da Igreja.
Poucas comunidades conhecerão este texto, que alguns consideram a “carta de emancipação das comunidades e dos leigos”. Mas não o conhecem porque talvez ninguém lho tenha referido nem explicitado e porque os cristãos não têm tempo para ler e meditar estes documentos.
Por isso, a comunidade deve debater e dar o seu contributo para todos os problemas que afectam a sua zona e não ficar fechada nos seus problemas internos. É o que pede e recomenda o Concílio; “ Acostumem-se os leigos a trabalhar na paróquia intimamente unidos aos seus sacerdotes, a trazer para a comunidade eclesial os próprios problemas e os do mundo e as questões que dizem respeito à salvação dos homens" (AA 10).
Bonitas estas palavras, verdadeiro exercício de comunhão: “para que se examinem e resolvam no confronto dos vários pareceres”
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