divórcio ou casamento eterno?...

2009-10-31

CinV (39) Progresso policêntrico (nº 22)

Hoje o progresso é policêntrico porque os actores e as causas do (sub)desenvolvimento são múltiplas e variadas e é complexo porque as culpas e os méritos são também diferenciados, o que “deveria induzir a libertar-se das ideologias que simplificam, de forma frequentemente artificiosa, a realidade e levar a examinar com objectividade a espessura humana dos problemas”.
A primeira manifestação desta realidade complexa é que “hoje a linha de demarcação entre países ricos e pobres já não é tão nítida” como há 40 anos. Já João Paulo II destacara esta diferença: “Uma das maiores injustiças do mundo contemporâneo consiste precisamente nisto: que são relativamente poucos os que possuem muito e muitos os que não possuem quase nada. É a injustiça da má distribuição dos bens e dos serviços originariamente destinados a todos”. É, por isso, que “deveria ser altamente instrutiva uma desconcertante verificação do período mais recente: ao lado das misérias do subdesenvolvimento, que não podem ser toleradas, encontramo-nos perante uma espécie de superdesenvolvimento, igualmente inadmissível, porque, como o primeiro, é contrário ao bem e à felicidade autêntica” (SRS 38).

As fronteiras da pobreza já não passam apenas entre o Norte e o Sul, mas dentro de cada um destes blocos e mesmos dentro de cada país.
Nos países ricos, não só surgem novas pobrezas, como há categorias sociais que vão empobrecendo: todos lemos ou ouvimos que há já pessoas ditas da classe média que recorrem ao Banco Alimentar. Há já algum tempo que se tornou comum a expressão “Quarto Mundo”, um mundo dos pobres no interior dos países desenvolvidos. Todos acompanhámos a luta de Obama para impor uma Sistema de Saúde universal porque há mais de 30 milhões de americanos que não têm qualquer tipo de ajuda na área da saúde. E pior que isso vimos a resistência dos mais ricos a lutarem ferozmente contra este exercício de cidadania e solidariedade.

Mas também nos países, mesmo mais pobres, há pessoas que “gozam de uma espécie de superdesenvolvimento dissipador e consumista que contrasta, de modo inadmissível, com perduráveis situações de miséria desumanizadora”. A esta “miséria imerecida”, Paulo VI acrescenta “o escândalo de desproporções revoltantes, não só na posse dos bens mas ainda no exercício do poder. Enquanto, em certas regiões, uma oligarquia goza de civilização requintada, o resto da população, pobre e dispersa, é privada de quase toda a possibilidade de iniciativa pessoal e de responsabilidade, e muitas vezes colocada, até, em condições de vida e de trabalho indignas da pessoa humana"(PP 9).

Também a corrupção é “policêntrica”, isto é, está espalhada por todo o lado: “Infelizmente a corrupção e a ilegalidade estão presentes tanto no comportamento de sujeitos económicos e políticos dos países ricos, antigos e novos, como nos próprios países pobres”:
- quantas vezes não são respeitados os direitos dos trabalhadores tanto pelas multinacionais, que vêm de fora para se aproveitarem da mão de obra barata, como por empresas locais, que, dentro do próprio país, põem em prática métodos análogos, marcados pelas exploração e exclusão;
- “as ajudas internacionais foram muitas vezes desviadas das suas finalidades, por irresponsabilidades que se escondem tanto na cadeia dos sujeitos doadores como na dos beneficiários”

Até no âmbito dos bens imateriais ou culturais há uma espécie de “policentrismo”: tanto nos países desenvolvidos como nos outros “podemos encontrar a mesma articulação de responsabilidades: existem formas excessivas de protecção do conhecimento por parte dos países ricos, através duma utilização demasiado rígida do direito de propriedade intelectual, especialmente no campo sanitário; ao mesmo tempo, em alguns países pobres, persistem modelos culturais e normas sociais de comportamento que retardam o processo de desenvolvimento.”

Por outro lado, apesar de toda a aparente diversidade, o “uniformismo” vai proliferando e alastrando…

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