PALAVRAS DE VIDA ETERNA
Enviei para a minha habitual colaboração (quinzenal) no jornal Correio de Coimbra, que vai sair hoje, um artigo em que proponho a criação, no Secundário, de uma cadeira "obrigatória" de História Comparada das Religiões, que substituiria as Aulas de Religião e Moral das várias religiões. Tenho consciência de que tal proposta pode ser polémica; por isso, aqui a deixo para dar oportunidades aos leitores para dar a sua opinião,
As sabidas palavras de Saramago sobre a Bíblia e Deus já foram mais que escalpelizadas, mas servem-me de fundo para algumas considerações avulsas.
A primeira pergunta que me ocorre é a de saber quantos cristãos leram toda a Bíblia: estou a falar de leitura, não de estudo ou de meditação. Todos conhecem a costela de Adão, a Torre de Babel, Sodoma e Gomorra, o “sacrifício” de Isaac, o prato de lentilhas de Esaú, o José na cisterna e a paixão da mulher do faraó. Mas estamos só no primeiro de 72 livros. Daí para a frente, conhecemos as pragas do Egipto e a passagem do Mar Vermelho, mas não saberemos que esta é para os Judeus o acto fundante do seu povo. As leituras dominicais vão lembrando outros livros, nomeadamente Profetas e Salmos: palavras que vão e vêm mas não ficam. Conhecemos melhor o NT, mas se tirarmos os Evangelhos, o que fica do resto? Dir-me-ão que bastam os Evangelhos para conhecer o Deus de Jesus Cristo e os valores do Reino de Deus. Eu calar-me-ia se visse que esse nosso conhecimento de Deus marca radicalmente o nosso modo de ser, de estar e de agir.
A profunda ignorância, que as palavras ditas por Saramago revelam, conduz-me a uma proposta que já aqui fiz há alguns anos, não sei quando. Por que não introduzir no curriculum escolar do secundário uma cadeira, séria e com igual dignidade das outras, de uma História Comparada de Religiões? As vantagens seriam muitas. Em termos intelectuais, daria a conhecer algumas das obras primas da literatura mundial, como a Bíblia e o Corão, mas também, por exemplo, o Poema de Gilgamesh, com a sua procura persistente mas sem sucesso da imortalidade, ou o Livro dos Mortos, mostruário da moral egípcia de então. Mas, sobretudo em termos culturais, faria com que nos víssemos diferentes, mas iguais, soubéssemos o que nos motiva, por que desejamos uma sociedade melhor; olhássemos o outro, diferente de mim, não como inimigo a abater, mas alguém que segue outros caminhos. Seria até um antídoto à tentação de considerar o meu caminho melhor que o dos outros. Os caminhos são diferentes, mas quem decidem qual é o melhor? E haverá um caminho melhor? Mesmo os ateus, os agnósticos, os indiferentes, talvez não sejam tão indiferentes ao Grande Mistério, ao mistério do homem e do mundo. Todos, directa ou indirectamente, procuramos descortinar esse Grande Mistério, que tem tantos nomes e caminhos quantas as culturas e os povos. É como se quiséssemos alcançar o cimo do Everest coberto de nevoeiro: cada um de nós, individual ou comunitariamente, para alcançá-lo dispõe de muitos caminhos, pois ninguém vê a meta final. Para mim, o Pai de Jesus Cristo, é esse Grande Mistério, pois é maior que todas as nossas representações, está para lá de toda a minha compreensão. Uma História Comparada das Religiões introduziria o respeito pelo outro, ajudar-me-ia a olhá-lo como alguém que me complementa e eu complemento, alguém que “é um dom para mim” (NMI 43), a perceber a legitimidade do seu caminho para o alto, apesar de diferente do meu.
Assim não seriam necessárias Aulas de Religião e Moral, católicas ou doutras confissões, com a vantagem de obrigar as comunidades a apostarem numa catequese bem preparada. Está a Igreja católica a cuidar bem da primeira parte da sua missão: anunciar a Palavra? Está a ser suficientemente “evangelizada para ser evangelizadora” (EN 15)? Por que se esgotam os seus catequistas primeiros (padres/párocos) na multiplicação de missas e na administração de sacramentos, descuidando a sua missão primeira que é serem servidores da Palavra? Pelo menos, foi o que repetiu várias vezes o Concílio: “Os presbíteros, como cooperadores dos Bispos, têm, como primeiro dever, anunciar a todos o Evangelho de Deus” (PO 4).
Eu sei bem e acredito profundamente que “nenhuma comunidade cristã se edifica sem ter a sua raiz e o seu centro na celebração da santíssima Eucaristia, a partir da qual, portanto, deve começar toda a educação do espírito comunitário. Esta celebração, para ser sincera e plena, deve levar não só às várias obras de caridade e ao auxílio mútuo, mas também à acção missionária, bem como às várias formas de testemunho cristão” (PO 6). A Eucaristia é o centro, onde vamos buscar o alimento vivificador e a força irresistível para irradiar por todos os âmbitos da vida: “Ide e testemunhai o que celebraste”, porque a “missa” não acabou, como muitos pensam; apenas começou, como poucos acreditam. Sem Eucaristia não há Igreja. Mas lá está o Evangelho a recordar que não basta: “Não é o que diz ‘Senhor, Senhor’ que entrará no Reino dos céus, mas o que fizer a vontade de meu Pai” (Mt 7,21). Será que os cristãos, que andam tão desnorteados como os outros, perderam o norte porque não tiveram sacramentos suficientes ou porque não tiveram suficiente catequese? O Papa bem recomendou aos nossos Bispos: “À vista da maré crescente de cristãos não praticantes nas vossas dioceses, talvez valha a pena verificardes «a eficácia dos percursos de iniciação actuais, para que o cristão seja ajudado, pela acção educativa das nossas comunidades, a maturar cada vez mais até chegar a assumir na sua vida uma orientação autenticamente eucarística, de tal modo que seja capaz de dar razão da própria esperança de maneira adequada ao nosso tempo».
Faz agora precisamente dois anos. Tempo demasiado para ainda nos lembrarmos: bispos, padres e leigos.
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13/11/09 10:12
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