divórcio ou casamento eterno?...

2009-12-13

CinV (66) Felicidade (nº 33)

Curiosamente nesta longa encíclica, a palavra felicidade aparece apenas duas vezes (33; 52) mas só neste nº há uma ligeira avaliação, pela negativa, da sua natureza: “a convicção de ser auto-suficiente e de conseguir eliminar o mal presente na história apenas com a própria acção induziu o homem a identificar a felicidade e a salvação com formas imanentes de bem-estar material e de acção social”.
De qualquer modo, no fundo, todos procuramos a felicidade; nem sempre da maneira mais correcta, mas o “ser feliz” é uma ânsia universal. Talvez por isso ela tenha sido um dos caminhos mais aliciantes de prender a atenção das pessoas. E nem sempre pelos motivos mais nobres.
Assim poderemos falar de várias formas de felicidade.

A felicidade, que vem do ter coisas ou até apenas do mero exercício de comprar, é uma felicidade infeliz, já que nos arrasta para “uma insatisfação radical, porque se compreende imediatamente que, se não se está premunido contra a inundação das mensagens publicitárias e da oferta incessante e tentadora dos produtos, quanto mais se tem mais se deseja, enquanto as aspirações mais profundas restam insatisfeitas e talvez fiquem mesmo sufocadas” (SRS 28).

A felicidade, que vem do prazer nas suas várias versões, é uma felicidade efémera. Esgota-se, como palha a que se ateia o fogo, tanto mais rapidamente quanto maior é a paixão. Ou então, dura ainda menos, quando o efeito do álcool ou da droga termina numa ressaca dolorosa. Então perde-se a “imagem integral do homem, que respeite todas as dimensões do seu ser e subordine as necessidades materiais e instintivas às interiores e espirituais. Caso contrário, explorando directamente os seus instintos e prescindindo, de diversos modos, da sua realidade pessoal consciente e livre, podem-se criar hábitos de consumo e estilos de vida objectivamente ilícitos, e frequentemente prejudiciais à sua saúde física e espiritual” (CA 36).

A felicidade, que vem do poder, tem, dizem alguns, uma dimensão erótica quase insuperável. Alimenta-se dessa sensação inebriante de “poder” dispor dos outros e das coisas a seu bel-prazer, de fazer e mandar fazer o que lhe apetece, podendo tornar-se numa verdadeira alienação e num exercício de domínio ditatorial, se não permitir que a atenção aos outros e o seu bem-estar não moderarem tal dinâmica.

A felicidade, que vem da “consciência do dever cumprido”, isto é, da convicção de viver coerentemente com as suas convicções, é uma felicidade interior mais genuína, mais à dimensão da pessoa, porque soube resistir às dificuldades inerentes aos seus compromissos e sentiu -se senhora dos seus actos e não controlada pelos vários “deuses esquecidos” que dominam grande parte da vida das pessoas. Sentir-se senhor de si e da sua vida em vez de ser empurrado pela vida dá uma felicidade que não sendo ruidosa cala no fundo do coração.

A felicidade, que vem do serviço aos outros, é uma felicidade também muito íntima e profunda, que nem as dificuldades do estar-ao-serviço conseguem apagar. Também esta não é vistosa nem barulhenta, mas é uma felicidade autêntica e libertadora, que nos faz sentir realizados como pessoa. É que o ser humano é um ser-para-os-outros: “Criado por Deus para a felicidade, o ser humano encontra na sua dedicação ao bem comum da comunidade em que se insere os meios para realizar essa felicidade pessoal e social” (Carta da CEP, Responsabilidade solidária pelo bem comum, 1).

Finalmente, para os crentes, a felicidade vem do seu encontro com Deus, no mais fundo da sua intimidade. Uma felicidade que pode passar pela “noite escura”, pelo êxtase ou pela alegria interior normal, mas sempre consciente de que a felicidade só atingirá a sua plenitude no Reino de Deus. É esta felicidade que nos leva a viver, mesmo no meio das dificuldades, com alegria, aquela alegria que Palavra da Liturgia de hoje repete tão insistentemente: “Clama jubilosa… solta brados de alegria… exulta, rejubila de todo o coração” (Sof 3,14); “Entoai cânticos de alegria” (Is 12, 6); “Alegrai-vos sempre no Senhor. Novamente vos digo alegrai-vos” (Fil 4,4).

De um modo ou doutro, todos andamos atrás da felicidade. Os caminhos são muitos. A opção está nas mãos de cada um. O mal é que muitas vezes não optamos; deixamo-nos levar…

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