Caminhos de Deus, caminhos para Deus
O primeiro encontro que Deus teve comigo foi na primeira
comunhão. Certamente antes a minha mãe, a minha catequista, certamente me falou
de Deus, mas não me lembro. Foi naquele momento solene que a minha memória
recorda como o primeiro encontro. E foi muito negativo. Lembro-me perfeitamente
de uma rapariguinha da minha idade que estava ao pé de mim ter começado a
chorar compulsivamente ao comungar. Porque tinha “tocado com a hóstia nos
dentes”. Este era um dos ensinamentos solenes que nos era ministrado. Eu possivelmente
nunca tinha tomado consciência da imensidão desse pecado: “tocar com a hóstia
nos dentes”. E recordo-me de ter ficado perplexo perante este Deus que fazia
chorar a minha companheira. Aquela ideia de um Deus castigador por coisas tão
insignificantes começou a perturbar-me. Fiquei com medo desse Deus.
Depois nos tempos seguintes não tenho nenhuma memória especial.
Continuava a rezar – em minha casa rezava-se o rosário todos os dias – a ir à
missa, a comungar, a cumprir as Primeiras Sextas-feiras e os Primeiros Sábados.
Não sei bem como ligava estas coisas todas com Deus.
Mais tarde, adolescente, no Seminário, o problema voltou e
voltou ainda com essa imagem da menina a chorar. Comecei a interrogar-me sobre
Deus, a procurar Deus. Sentia o coração perturbado, a dar voltas. Uma ou outra pessoa
começou a falar de Deus Amor, mas eram mais os dedos inquisitoriais a falar de
castigo, de condenações ao inferno. Esta pastoral do medo ainda mais me
empurrava para mais depressa descobrir quem era Deus, pois eu não conseguia
entender um Deus tão mau que nos mandava quase todos para o inferno. Havia qualquer
coisa que não batia certo. Foi pois um grande alívio quando, cansado desta luta
interna, a partir de dada altura descobri Jesus Cristo ou Ele me descobriu a
mim. E essa foi a descoberta mais importante da minha vida, a que me marcou indelevelmente
para sempre. Descobri rapidamente que essa de “bater com a hóstia nos dentes”
era mais uma de muitas normas, cangas, que uns senhores de Roma atiravam sobre
nós, mais preocupados com acessórios ridículos do que com o essencial. Então
comecei a meditar mais profundamente o Evangelho, a Boa Nova de Jesus Cristo.
Eu que me considerava um pecador quase condenado – porque não obedecia aos meus
superiores, porque tinha maus pensamentos e más acções, porque não rezava as três
Avé Marias ao deitar – encontrava na parábola do Filho Pródigo, naquele Pai que
esperou todos os dias pelo filho pecador e depois fez uma festa de arromba pelo
seu regresso – porque estava perdido e encontrou-se – uma calma interior tão
grande que os meus pecados pareciam insignificâncias. E aquele Pai era o “meu”
Deus, o Deus que eu procurava, o Deus que me enchia a alma. Era um Pai que
amava infinitamente os seus filhos pecadores. Amava-os, percebi mais tarde, não
porque eram bons, mas porque Ele, Deus, é a Bondade e Amor infinitos. Talvez na
altura tivesse começado a viver não só de uma espiritualidade exterior, feita
de ritos e orações memorizadas e cadenciadas, mas de uma outra espiritualidade mais
interior que me permitiu descobrir que Deus é Pai, é meu Pai (a ideia é de
Tolentino Mendonça).
Mas acho que ainda não percebera que Deus é nosso Pai, é “Pai
Nosso”. Esta ideia surgiu mais tarde, quando me apaixonei pelo Sermão da
Montanha e procurava lá as regras de vida, as orientações para melhor seguir o
meu grande Amigo, Jesus Cristo.
Mas vou deixar esta história para a próximo post.
1 Comentários:
ESpero que o próximo post não demore, porque estou mesmo curiosa.
Bem-haja pela partilha.
Abraço.
CG
14/11/12 16:33
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