divórcio ou casamento eterno?...

2006-04-25

A hora (ou o ora) dos cidadãos (2)

Somos um país de extremos e exageros.
Ora surgem loas e palmas exageradas à acção do governo, ora caímos da depressão de que a crise é ão profunda que não temos salvação.
Ambas as atitudes são desastrosas pois apontam mais para o triunfalismo alienante ou para o desespero parilizante do que para um estímulo são à tarefa de reconstrução da sociedade numa contínua resposta aos desafios que cada viragem da história nos coloca.
Também aqui a opção é entre a hora dos cidadãos ou o "ora o que posso eu fazer perante a enormidade das questões".
Este desabafo, além de fatalista, esconde outro erro: a questão não é o que posso eu fazer, mas o que podemos nós, todos nós, fazer.
E para que o desânimo não nos invada demasiado é bom não deixarmos que sejam apenas os economistas a falar. Hoje neste país tudo se mede por números como se esses fossem os únicos indicadores seguros da nossa situação. Onde está contabilizado tanto trabalho voluntário, tanta dedicação de servidores públicos, tanta capacidade humana que corre o risco de ser desaproveitada, porque não é fácil contabilizá-la em euros? Não haverá vida para lá do défice?
Também aqui os cidadãos têm uma tarefa fundamental que passa por várias atitudes: uma particular atenção aos comportamentos e decisões do governo, até porque se trata de um governo maioritário, o que é sempre uma tentação para não ouvir os outros; mas também um compromisso sério na mudança de atitudes: uma verdadeira solidariedade entre todos, para que todos e especialmente os mais favorecidos "paguem mais a crise"; um espírito mais sóbrio nos nossos gastos, recusando os enormes desperdícios que todos fazemos; uma capacidade de viver de acordo com as nossas posses; um adequado aproveitamentoe e rentabilização das nossas energias nacionais.
Também aqui a opção é entre a hora da conversão e da mudança de atitudes ou o "ora, os outros que mudem!"

A hora (ou o ora) dos cidadãos

Vivemos um período em que os exemplos de algumas figuras públicas e com especiais responsabilidades sociais pouco estimulam o sentido cívico dos cidadãos.
E a tentação imediata é demitirmo-nos e aceitar como inevitável tais comportamentos. E, pior ainda, ignorar ou assumir idênticas atitudes.
A democracia é um estatuto difícil de conseguir e sobretudo exige uma "vontade moral" para a construir, numa construção diária e permanente, num esforço continuado porque nunca pode ser dado por terminado. Ora um esforço assim é muito difícil de manter sobretudo se não houver da parte dos outros cidadãos e especialmente dos mais visibilizados idêntica preocupação.
Por isso, mais que nunca agora é a hora dos cidadãos, mais tentados a deixar correr, num encolher de ombros e num desabfo do "ora, que me interessa isso!".
Este é também o grande desafio do 25 de Abril: não só dar espaço à participação de todos, mas sobretudo criar e estimular a consciência de que cada um de nós tem a obrigação de ocupar o seu espaço, partilhando opiniões, atitudes, sugestões, criticas, acções, cada um segundo os seus carismas e talentos.

2006-04-16

Páscoas

As duas grandes festas do cristianismo continuam a pautar, de modo decisivo, a nossa vida social. Páscoa e Natal marcam espaços sociais marcantes. São tempos de ruptura com a rotina do dia a dia. Marcam férias escolares, são ocasião de tolerância de ponto, etc..
Contudo verificam-se diferenças significativas entre as duas épocas.
O Natal é aproveitado sobretudo para viver a festa da família, para visitar familiares que só se vêem uma ou duas vezes por ano.
A Páscoa, embora permita também encontros familiares, está mais virada para mini-férias de lazer, particularmente as idas à neve, apesar de o Natal poder estar mais associado a este evento climatérico.
Mas há outras diferenças, culturais, associadas ao facto de a dimensão religiosa está a ter cada vez menos significado.
O Natal foi sobretudo tomado de sassalto pelo consumismo: a angústia da prenda que manifeste o nosso apreço pelos familiares e amigos domina grande parte dos dias anteriores a esta quadra ainda cheia de sentimentos de sã alegria.
A Páscoa foi tomada de assalto pelo laicismo. Não sei quando começou mas pelo menos este ano reparei num gesto absolutamente insignificante: houve jogos de futebol na sexta-feira santa, no sábado "santo" e até no próprio domingo de Páscoa e na segunda ao ritmo marcado pelas televisões. Este gesto aparentemente tao inócuo despertou-me para a perda desse "sinal religioso". Afinal a Páscoa é importante porque nos garante mais um ou dois dias e meio de férias.
Nós os cristãos celebramos a Páscoa através das festas litúrgicas que decorrem em todas as Sés e todas as igrejas mas parece que não somos capazes de mostrar que a Páscoa, a Páscoa da Ressurreição, é a prova indesmentível de que só é válida uma vida dedicada à defesa da dignidade da pessoa, à luta pela justiça e pela paz, à construção de um socieddade mais humana e solidária. A Ressurreição veio mostrar que nada acaba com a sexta-feira santa. Mais: que a sexta-feira santa significa a morte para o "homem velho", para as nossas falhas, de indivíduo e de sociedade, para as nossas corrupções, demissões, omissões. E a Páscoa da Ressurreição é a certeza de que este mundo, que está sempre em mudança, caminha para um estado final onde as limitações e as falhas serão superadas de modo definitivo.
Os cidadãos não têm que viver, como nós, a nossa Páscoa. Nós é que temos que a viver como a festa fundante: "se Jesus não ressuscitou é vã a minha fé!".
Mas compete-nos pelo menos testemunhar essa certeza e, num tempo de falta de sentidos e de esperança, proclamar a certeza num final feliz da nossa história. Que as pessoas vivam laicamente a Páscoa não deve levar-nos a lamentações inconsequentes mas estimular-nos a proclamar este bem precioso que é a certeza - uma certeza absoluta - de um futuro feliz.

2006-04-04

Quotas ou "Cotas"?

A lei da paridade (de género, como se diz agora) veio mostrar como somos ainda tão machistas tanto os homens como as mulheres.
As reacções a esta lei foram feitas a partir do pressuposto que vinha impor uma quota mínima (1/3) de mulheres nas listas para os vários órgãos de poder.
Ora o que a lei diz é que, nas listas, não pode haver mais que dois nomes seguidos do mesmo sexo; não diz que não pode haver mais que dois homens seguidos. Portanto se há quotas elas são tanto para homens como para mulheres.
Por isso é de estranhar (ou talvez não...) que sejam as mulheres as perimeiras a recusar quotas para as mulheres quando não é isso o que está na lei.
O problema (freudiano!?) está em que, embora a lei não refira explicitamente as mulheres, no fundo é nelas que todos pensamos... possivelmente até o próprio legislador.
E com esta mentalidade não vamos muito longe...
Por isso, fica a pergunta: trata-se de uma questão de quotas ou somos todos uns "cotas"?