divórcio ou casamento eterno?...

2009-06-30

Michael Jackson

Já estou em casa depois de ter feito a operação ao pulmão esquerdo. Correu bem e espero que a recuperação, embora lenta, também o seja.
Das muitas coisas que fui pensando enquanto olhava o tecto do quarto ou andava por aqueles corredores escolhi para recomeçar não a mais importante, mas a que maiores interrogações me colocou.

Não tenho competência(s) para julgar MJ considerado o “maior” da música pop nem a sua magia para cantar e a dançar.
Mas a pergunta, que me atenaza o espírito, dadas as horas e horas de emissões televisivas que lhe foram dedicadas, é muito simples: é este o tipo de Homem que a sociedade hoje quer cultivar e portanto passar para as gerações seguintes, concretamente os nossos filhos?
Bastará ter vendido cem milhões de um disco para ser considerado modelo a seguir, estilo de vida a imitar?
Bastará ser criativo no seu género?
Não andou ele tantas vezes envolvido em “escândalos” de vários tipos, em acusações, que os tribunais consideraram infundadas, de pedofilia, em atitudes e comportamentos exóticos e até excêntricos?
Talvez seja verdadeiro aquele o comentário de um preto americano que dizia que ele fez mais pelo pretos americanos do que Luther King, Ophra Winfrey ou Obama, porque o fez antes deles.
Talvez. Mas será que o Homem negro se revê em MJ?
E se se revê, revê-se em que qualidades?

Espero que os melómanos me não crucifiquem.
Gostava, no entanto, que me respondessem à “pergunta que me atenaza o espírito” e que posso formular de outra maneira: Que mundo queremos construir? Assente em que valores? Que qualidades deve ter um cidadão?

De uma coisa estou certo: ele passará para a história como um monstro sagrado da música; de mim nem uma linha. Mas não fico com ciúmes nem inveja da sua glória.
Mas ficará a eterna questão “de quem é o Homem” que continuará a exigir respostas e comportamentos humanos adequados a cada época. Mesmo que as televisões se esqueçam de a colocar nos seus horários “nobres”.

Que MJ esteja em paz!

2009-06-17

Fernanda Serrano

Todos nos congratulámos com o nascimento de mais uma sua filha.
Mas o que talvez nem todos saibamos é que ela soube da sua gravidez quando acabara de fazer quimioterapia contra o cancro da mama.
Querer ter um filho nestas condições envolvia muitos riscos para ela e para a criança.
Mas ela resolveu corrê-los em favor de mais uma vida que, a não ser assim, seria destruída. Medicamente até haveria razões para lhe pôr termo. Mas ela assumiu a criança com tudo o que de bom (que espero que seja muito) e de mau (que espero não seja nenhum) isso significava.
Se registo este facto “insignificante” é porque me parece que vale mais um gesto destes em defesa da vida do que os milhares de assinaturas que não acarretam risco nenhum para quem assina.
Mas, como diz o outro, talvez devamos ver cada coisa no seu lugar.

E agora uma nota pessoal. Por estes dias mais próximos não poderei vir aqui porque vou amanhã dar entrada no hospital para ser operado, na sexta-feira, mais uma vez, ao pulmão esquerdo. Tudo por causa de uma metástase que resolveu anichar-se ali.
Espero retomar os nossos encontros em boa forma daqui a duas semanas, nunca antes certamente.
E viva a vida com alegria, paz e amor para todos!

2009-06-15

Mata do Choupal em Coimbra

A proposta de construir um viaduto rodoviário com 40 m de largura e uma extensão de 150 m sobre o Choupal estimulou um conjunto de cidadãos de Coimbra a unirem-se e a exercerem este exercício de cidadania que se opõe a mais uma destruição irremediável do Choupal.
A absoluta indiferença dos autarcas e de tantos doutores que a nossa universidade forma e de tantos que nela leccionam é dos maiores atentados à cidadania a que se assiste entre nós. Uns por lucro; outros por comodismo; outros porque vivem fechados na concha dourada da sua investigação; outros porque o que querem é que os deixem em paz; tudo isto levou a que chegássemos a este estado.
Para mim, mais preocupante que mais um viaduto (e já agora para que quer Coimbra, um cidade em crescente descrédito e degradação, quatro pontes rodoviárias mais uma que se anuncia!?) é o sucessivo abandono a que tem sido votada a Mata do Choupal. Espaço privilegiado por excelência para o contacto com a natureza, espaço de fruição e de lazer, pulmão fundamental da cidade, nada moveu os cidadãos de Coimbra a amarem e assumirem como seu este espaço verde, espécie cada vez mais rara na nossa cidade. Abandonada, afogada pelas ervas daninhas e troncos carcomidos a apodrecer pelo chão, com um velho e envergonhado circuito de manutenção, sem actividades para as escolas e para os cidadãos, a Mata foi definhando, quando podia ser um espaço fervilhante de actividades, as mais variadas. E, hoje, quem conhece esta Mata que devia ser o orgulho dos conimbricenses, a começar pelos autarcas (agora muito mais preocupados em fazer rotundas, algumas bem perigosas para os automóveis já que se elevam um palmo acima do piso rodoviário)?
Mas onde estão hoje os autarcas de Coimbra que gostam de uma Coimbra bonita, com qualidade de vida para os seus cidadãos? E se alguma coisa se fez junto ao rio deve-se ao programa Polis e não ao amor e carinho dos nossos autarcas.
Coimbra, cidade da cultura?
Coimbra, cidade da saúde?
O que é feito dessa Coimbra, culturalmente tão rica, historicamente tão antiga?
É tempo dos seus habitantes se tornarem a sério cidadãos e não permitirem as barbaridades por acção e por omissão que sistematicamente são cometidas por autarcas parolos, que até tem legitimidade para fazer esses disparates, pois foram eleitos democraticamente. E nós, sempre venerandos e atenciosos, esperamos ansiosamente pela escolha “exemplar” dos partidos para saber em quem votar.
Não haverá um grupo de cidadãos que ame Coimbra a sério e tenha um projecto sustentado de desenvolvimento que concorra à rebelia dos órgãos partidários nacionais?
Coimbra a cidade dos doutores em leis, em línguas, em história, em geografia, em física, em química, em todas as engenharias, em medicina, em enfermagem, em psicologia, em economia e não sei quantos mais, que raio fazem tantos doutores?
Longe vão os tempos dem que o fadista cantava “Do Choupal até à Lapa / É Coimbra dos meus amores /…”
Eu sei que a melancolia do passado nada resolve.
Mas se não guardarmos e respeitarmos o passado, onde ancoramos a nossa identidade?

2009-06-07

Machadadas na Cidadania

Não vou falar na vergonhosa atitude dos nossos deputados a propósito do Provedor da Justiça. Bastará recordar as palavras de Jaime Gama: “Se com tanta facilidade se entenderam sobre, por exemplo, a lei do financiamento dos partidos – porventura convalidando soluções que nem sempre serão as mais adequadas – têm toda a oportunidade aqui para se entenderem sobre o Provedor da Justiça”. Palavras certeiras: as primeiras criticam os deputados que se unem quando a corrupção anda por perto, mas a seu favor; as segundas denunciam um exercício de “ódio político”, que se pensava arredado do Parlamento.
Assim se vai destruindo a cidadania num lugar que devia ser uma das suas sedes mais nobres. Facadas à Zé do Telhado.

Mas hoje queria falar um pouco das eleições europeias e a sua campanha. É realmente curioso o pó que os nossos candidatos a eurodeputados têm à Europa. Claro que quase 10 mil euros (ordenado e despesas de representação), mais 200 e tal diários para “refeição”, mais viagens pagas contra recibo, etc. não é petisco que se deite fora mesmo que não gostem da Europa. Com raras excepções, pouco ou nada se disse. Nem sequer mal. O Espírito Santo diz nestas situações: “vomito-vos porque não sois quente nem frios” (Ap 3,15-16). É bom ser ateu neste caso.
O mais interessante é que mesmo os chupistas dos Irlandeses, que sacaram pipas de massa da EU, já estão dispostos a dizer sim a esse nefando Tratado de Lisboa. Os Islandeses, agasalhados no seu “orgulhosamente sós” já só querem é entrar seja como for.
Pertencer à Europa certamente que acarreta custos, sobretudo de egoísmos nacionais, de cedência de soberania, de imposição de normas que não achamos simpáticas, de predomínio dos grandes sobre os pequenos e outras cedências que o viver em conjunto implica.

Mas nós só subsistiremos na Europa, numa Europa que seja forte em todos os âmbitos. Que seja capaz de ombrear com as velhas grandes potências – Estados Unidos e Japão – e a novas emergentes – os BRIC. Temos de ter consciência de que a Europa, apesar das suas actuais dificuldades em manter o seu modelo social, apesar das vergonhosas leis sobre imigração, apesar da sua incapacidade para se opor à globalização / deslocalização económica, ainda tem uma cultura que tem de ser reforçada, valorizada, actualizada, e que, se souber resistir à tentação do etnocentrismo, pode ajudar muitas outras regiões com parcerias e até como modelo. Para isso, precisamos de um Parlamento forte, que, neste momento, já co-influencia 60% das decisões comunitárias e com o Tratado de Lisboa aprovado verá esse número elevar-se para 90%. Só unidos seremos capazes de ajudar significativamente a vencer a crise e não deixar que tudo fique na mesma e daqui a meia dúzia de anos vivamos outra crise análoga.
A Europa tem como característica, apesar dos desencontros, das arbitrariedades, de decisões pouco compreensíveis, “ser aberta”, “ser acolhedora”. Ela e os seus descendentes directos criaram a democracia moderna, demasiado formal, mas lá vamos avançando ao ritmo que os cidadãos exigem; desenvolveram um conjunto de direitos humanos fundamentais que, pouco a pouco, vão ganhando adeptos noutras culturas; estabeleceram, no meio de muitas atrocidades comandadas pela muita ganância e sede do ouro de alguns, diálogo com outros povos e outras culturas. Mesmo a Igreja católica, que devia ser católica (= universal) com o Vaticano II não só se desromanizou como se deseuropeiou… pelo menos teoricamente.
Os nossos candidatos à Europa não falaram das vantagens e dos inconvenientes de ser europeu. Ignoraram o facto. Preferiram falar da política caseira como se fôssemos a coisa mais importante do Universo, como se muita dela não seja e sobretudo não venha ser cada vez mais determinada (espero que concertada com os outros países), como se as principais acusações ao governo de Sócrates não tivessem algumas como causa a Europa e nesse caso o que fazer ou sejam apenas culpa dele e nesse caso por que não esperar mais um pouco, que deve começar dentro de momentos.
Mercenários da política e quem fomos chamados a eleger hoje. Não será de admirar que muitos desistam de votar e de exercer esse pequeno mas simbólico acto de cidadania.
Quando precisávamos de uma Europa mais forte, mais solidária, mais justa, mais humana, os nossos candidatos não quiseram mobilizar-nos. Mais, desprestigiaram a Europa, o inevitável caminho nosso futuro. A pobreza de um país começa pelas suas supostas elites.
Assim se (des)constrói a cidadania neste país, sob a batuta dos mais ilustres dos nossos políticos.